Hugo Navarro da Silva |
As cidades são como os indivíduos. Têm necessidades, queixas, frustrações e anseios. Há pessoas simples, acanhadas, resignadas, eternamente submissas a subalternidades, que julgam natural destino e irremovível fadário, como certas cidades, que às vezes encontramos a modorrar em eternos atrasos, seculares retraimentos e penosas inações. De tais pessoas é paradigma o Jeca Tatu, de Monteiro Lobato, que diante de “barriga” na parede,dizia não temer desabamento porque tinha uma boa “escora”, apontando para litografia de Nossa Senhora. Jeca Tatu era personagem de folheto de laboratório farmacêutico, que divulgava remédio contra a ancilostomíase, também chamada de “amarelão” e “opilação”, enfermidade durante muito tempo apontada, com a cachaça e a farinha de mandioca, como causadora de males, que atingindo o fígado e as tripas, desgraçava o povo brasileiro, principalmente no nordeste, provocando preguiça crônica, desesperança e desinteresse pelas conquistas, tirando, das vítimas, a vontade de trabalhar e de progredir.
Há exemplos, entretanto, de cidades, que por diversos motivos, misteriosamente tocadas de fagulha ou faísca elétrica, como o monstro de Mary Shelley, ganham vida nova passando a exigir conquistas e novidades gerando incoercível impulso para o progresso. Assim, quando movidas e estimuladas, as cidades não apenas se torna mafetadas e orgulhosas. Mostram-se nervosas e exigentes, embora algumas nem sempre possam manter o ritmo de vitórias e aquisições.
Salvador, a capital do Estado, depois de alcançar o que poucas cidades brasileiras conquistaram em matéria de notoriedade e equipamentos, desejou possuir metrô, meio de transporte que fez famosas várias metrópoles do mundo. Falhou. O metrô soteropolitano em pouco tempo poderá motivar o turismo do fracasso e da decadência. Há cidades que tiram lucros de suas ruinas. O orgulho ferido, entretanto, está remendado pela promessa de espécie de trem bala, muito mais empolgante e rápido, e pela garantia da sensacional ponte de Itaparica. Cuida-se, desta forma, de aplacar as iras dos impacientes e de lhes renovar doces esperanças. Roma não se fez num dia e é necessário lembrar, aos apressados, que de sonhos também é feita a exiistência.
Feira de Santana venceu a fase do marasmo, cresceu, engrossou cangote, ganhou vaidades, impaciências, e passou a exigir, veementemente, dos governantes, o que outras prósperas cidades possuem, ainda que em forma de promessas eleitoreiras.
Milagrosamente, no começo desta semana, encontrou alívio ao descobrir que seus mais reclamados desejos estavam plenamente realizados. Recebeu, do próprio governador, diretamente, de corpo presente, aeroporto pronto, completo, operacional, e outras notáveis e desejadas obras, em forma de promessas, é claro, mas, como diz o povo, a ilusão faz parte da existência e é sempre conveniente lembrar a advertência do jornalista Telmo Martino: “O melhor da ópera é o lustre”.
Hugo Navarro da Silva - Santanopolitano, foi aluno e professor do Colégio Santanópolis. Advogado, jornalista escreve para o "Jornal Folha do Norte". Gentilmente, a nosso pedido, envia semanalmente a matéria produzida.
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