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FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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terça-feira, 25 de janeiro de 2022

POLÍTICA DE ANTÃO - I

MARCOS PÉRSICO – Santanopolitano, cineasta, teatrólogo, escritor.

A PREPARAÇÃO DO COMÍCIO

    [...] Quem não se lembra dos velhos comícios? Era um tempo poético. Existiam figuras folclóricas. Hoje com o palanque eletrónico e os marqueteiros de plantão, tudo é muito ensaiado, sem graça. Sem poesia. [...]

A BANDA DE CARUARU irrompe pela cidade, arrastando o povo para o palanque, mas sem deixar de dar algumas voltas pela praça. Havia pessoas de todas as classes. Parecia uma festa de largo, aquelas em que se festeja a festa da padroeira. Tinha muita criança fazendo barulho, e criança não vota. A meninada estava animada com a distribuição gratuita de pipocas que o coronel contratou em Parnamirim. Alguns meninos entregavam panfletos com os seguintes dizeres:

Coronel Salustiano

PREFEITO
É o povo sendo eleito!

Mas, o panfleto que mais incomodou o outro lado foi:

Para governar a cidade.

Eleja um homem de verdade.

Coronel Salustiano

PREFEITO


Quando o delegado recebeu esse panfleto, foi para o quarto, pegou seu revolver, colocou seis balas e quando saía espumando de raiva entra seu Zeca aflito:

- Delegado, eu preciso conversar com o senhor...

-      Agora não seu Zeca, agora eu vou ali matar um cabra safado que diz que eu não sou homem...

-      Delegado... O coronel me deu isso e quer que eu seja do lado dele...

O delegado parou, pegou o papel de filiação do outro partido, olhou bem nos olhos do seu Zeca e disse:

-      Seu Zeca, isso aqui não serve nem pra limpar o rabo sujo de merda.

-      E o que eu faço, delegado? O coronel disse lá no bar que está me esperando no palanque. O senhor acha que devo subir no palanque dele?

O delegado muito irritado responde:

-      Vá seu Zeca, sobe no palanque dele e aí o senhor só desce de lá nos braços do povo, seu Zeca... Morto... Entendeu seu Zeca? Morto... Pois eu lhe dou um tiro daqui da minha janela.

-      Que é isso, delegado? O senhor vai ter coragem de atirar em mim?

-        Se subir naquele palanque, o senhor só desce morto.

-        E o que eu faço então?

-       Vá distribuir panfleto no meio do povo que é melhor. Minha candidatura é vitoriosa... Vou derrotar esse coronel de qualquer maneira, nem que eu tenha que jogar sujo na eleição.

Seu Zeca se retirou e o delegado até esqueceu que ia matar o coronel. Guardou a arma na gaveta e ficou na janela assistindo aos acontecimentos.

A banda sobe no coreto e executa Asa Branca. O povo se aproxima cada vez mais.

O delegado procura fazer uma estimativa de quantas pessoas havia na praça. De repente, chega à casa do delegado o atual pre­feito acompanhado de alguns vereadores.

Serapião Bezerra, vestido num terno de linho branco, chapéu panamá e sapatos de duas cores. Estava impecavelmente trajado. Junto com ele vieram os vereadores, Tonho da Cachorra, Pedro Burrinha e Boca de Sulapa.

Pedro Burrinha já estava bêbado e foi logo vomitando na sala do delegado. O vómito fedia a azedo, e o jato foi tão forte que alagou a toalha da mesa. O líquido do vómito foi absorvido pelo pano e só ficaram alguns pedaços de carne mal mastigada, que devia ser o tira-gosto ingerido durante a bebedeira.

D. Catuta tratou de retirar logo a toalha e a levou para os fun­dos. Na volta, trouxe a licoreira com um bom licor de maracujá e algumas taças. Maria Flor trouxe uma tigela de porcelana cheia de amendoim cozido. Mas o cheiro do vómito continuou.

Lá fora o pau tava comendo, como se diz na região.

Fogos estouravam enquanto as autoridades iam chegando aos poucos e subindo no palanque.

Um locutor anunciava de vez em quando:

-     Dentro de mais alguns minutos estaremos recebendo o futu­ro prefeito de Nossa Senhora das Dores.

O povo aplaudia.

-     Neste instante, anunciamos a chegada do Sr. Leocádio da Mandioca, muito digno morador da zona rural, e que vem dar o seu apoio à candidatura do coronel Salustiano.

O povo aplaudia.

A boca de alto-falante instalada na frente da casa do delegado impede que lá dentro eles conversem. O delegado se acotovela na janela e fica olhando quem são as pessoas que estão por lá.

De repente, avista o vereador Manoel Doca subindo no palan­que. O delegado espuma de raiva e chama o prefeito Serapião para averiguar.

-      Aquele não é Manoel Doca? - Pergunta o delegado.

O prefeito apurando as vistas...

-      E não é que parece ele mermo?

O delegado chama Tonho da Cachorra e diz:

-     O Tonho... Vá até lá e se certifique se é Manoel Doca que se bandeou pro outro lado...

Tonho da Cachorra saiu se esgueirando por entre o povo até chegar perto do coreto. Ao se aproximar, o locutor anuncia:

-     Acaba de chegar neste palanque para dar o seu apoio à can­didatura vitoriosa do coronel Salustiano o vereador Tonho da Ca­chorra...

O povo aplaudiu gritando:

-     Tonho, Tonho, Tonho!

Ele se entusiasmou e acabou por subir no palanque e acenou para o povo.

O delegado indignado exclama:

-    E não é que aquele filho da puta também subiu no palanque... listou enrolado no xale da doida... Até meus vereadores estão me traindo...

O prefeito Serapião interrompe:

-    Calma, delegado Gilberto, é assim mesmo... Eu tenho a cer­teza da nossa vitória, aqui sempre foi reduto do PSD, não é agora que vai mudar.

Na entrada da praça estouram alguns fogos. Era o anúncio da chegada da comitiva e junto com ela o candidato da UDN, Coronel Salustiano. O povo acompanhava o cortejo e o candidato acenava muito, estava eufórico. Numa provocação, o coronel fez questão que a comitiva passasse em frente à casa do delegado.

E assim foi feito.

Pararam, soltaram fogos e acenaram para o povo, sem olhar para a janela onde estavam todos acotovelados, olhando com certo desdém.

A caravana seguiu em frente. A banda tocava um frevo, o povo dançava, até que o coronel chegou ao palanque.

Nesse instante, o locutor anuncia:

-   Povo de Nossa Senhora das Dores... Sobe neste instante ao nosso palanque, o futuro prefeito da cidade.

Os fogos estouram num barulho ensurdecedor, o povo aplau­de e grita; e a banda toca cada vez mais eufórica.

Na casa do delegado Gilberto, ninguém conversa. O barulho do alto-falante é muito alto.

As outras autoridades que vieram de outras cidades sobem e está armado o comício de lançamento da candidatura do coronel. Algumas faixas são exibidas com o nome do candidato.

[...] Silêncio... a banda parou de tocar. Algumas pessoas ainda conversam baixinho, crianças gritam alguém pigarreia alto. Vai começar o comício [...] Silêncio... a banda parou de tocar. Algumas pessoas ainda conversam baixinho, crianças gritam alguém pigarreia alto. Vai começar o comício [.[...] Momento decisivo na carreira política. Hora de testar popularidade, conhecimento, capacidade de oratória e convencimento. Vamos aos fatos. [...] (Continua na próxima postagem).


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