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FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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domingo, 9 de janeiro de 2022

A TELEVISÃO - IV (final)

MARCOS PÉRSICO – Santanopolitano, cineasta, teatrólogo, escritor.

A TELEVISÃO - III


Era um quarto simples, mas muito bem cuidado. Tinha uma cama patente, muito velha, mas conservada, não tinha colchão, era um monte de panos velhos arrumados por cima das molas da cama. A coberta estava amontoada e deu pra perceber que era um chenil vermelho desbotado. O travesseiro era uma almofada velha revestida por um pano encardido. Tinha um armário em madeira bem escura onde ele guardava seus pertences, se é que tinha al­gum. Colado à parede havia um pedaço de espelho oxidado pelo tempo, mas que dava pra ver alguma coisa. Um interruptor da luz do quarto com um fio trançado subindo pela parede onde estavam pendurados, um pente com alguns dentes quebrados, uma revista O Cruzeiro, onde podia se ver a foto de Juscelino sempre sorriden­te, e um lápis com a ponta quebrada. Em baixo do armário, tinha uma mala de couro bem envelhecida e coberta de poeira e ao lado da cama tinha uma mesinha bem cuidada, onde por cima de um paninho velho e puído estava o seu grande tesouro, o rádio.

O rádio era o seu grande companheiro e vivia ligado toda vez que seu Roberto entrava naquele cômodo. Quem quisesse saber se ele estava no quarto, bastava encostar perto da porta e se ouvisse o barulho do rádio, seu Roberto estava lá.

O coronel depois de olhar tudo em volta, franziu a testa e perguntou?

-   Posso saber o que está acontecendo aqui nesta casa?

-   Inhô?

-   Posso saber por que o senhor não saiu do quarto ainda? Nem o leite o senhor tirou?

-   Não saí, mode que aquela caixa lá na sala tem coisa do demónio dentro.

-   Larga mão de ser cagão! Você é homem ou um saco de batata?

-   Não sinhô... Sou home, coroné... Mar cuntece que aquela caixa tem esprito... Eu vi coroné... Eu juro que vi.

-   Vá trabalhar que é melhor velho cagão... Tem espírito coisa nenhuma.

-   Tá bom, eu vô, mas naquela sala eu não entro.

-   Vá colocar lenha no fogão e chame Victória pra fazer o café da manhã, hoje é domingo...

E foi andando pra dentro de casa. Ao entrar, encontrou D. Emengarda colocando a mesa pro café.

O coronel foi logo perguntando:

-   Onde está Victória? Não tem nada pronto pro café...

-   Eu acho que Victória sumiu, não dormiu em casa e não tem lugar que eu procure mais...

-   Que diabos foi que houve? Ela não costuma sair assim sem avisar.

- Pode ter certeza que foi por causa da TV. Quando o aparelho ligou, ela deu um grito e saiu correndo pros fundos da casa.

-   O rapaz que instalou a TV já se levantou?

-   Acho que ainda não.

-   Vou chamar, ainda tenho que levar pra pegar a marinete em Parnamirim, senão vai perder o transporte.

Saiu da sala e foi em direção ao quarto, o rapaz já estava pronto, só esperando a hora de sair. Tomou o café e foi pegar seu transporte de volta pra Recife.

Quando o coronel voltava de Parnamirim, passou no bar de seu Zeca e parou pra bater um papo com os conhecidos que estavam por lá. Ao descer do Jeep, viu que o bar estava cheio e fez-se um silêncio mortal. Todos fizeram questão de apenas olhar o coronel que entrou, cumprimentou a todos e pediu uma cerveja bem gelada.

Seu Zeca, que nunca se contém, foi logo perguntando.

-   E aí, coronel? O estrago foi grande na delegacia? Foram quantos tiros? O delegado também atirou?

-   Olha, seu Zeca, eu não gostaria de tocar nesse assunto e nem Ião pouco me lembrar do que aconteceu.

-   Mas coronel, só se fala nisso na cidade. Disseram até que o senhor acabou inimigo do delegado Gilberto.

-   Por favor, não me fale mais naquele sujeito.

Apareceu logo um curioso e perguntou sobre a TV, aí a conversa tomou outro rumo e o coronel foi discorrer sobre o que já assistiu e tudo o que ocorreu. Como todos os presentes se interessaram pelo assunto, a conversa do ocorrido na delegacia caiu no esquecimento
 

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