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FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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domingo, 31 de maio de 2020

CINE TEATRO SANTANA SAUDADES DO CINEMA DA RUA DIREITA



Foto da Fachada do cine-Teatro Santana extraída do livro
Memória Fotográfica de Feira de Santana. Fonte GAMA,
 Raimundo Memória Fotográfica de Feira de Santana:
 Fundação Cultural de Feira de Santana, 1994.



Nossa história começa num passeio corriqueiro entre dois personagens que caminham na Rua Conselheiro Franco: Arlindo e Henrique. Arlindo havia ido buscar seu neto Henrique no curso de teatro no prédio do CUCA - Centro Universitário de Cultura e Arte. Henrique estava intrigado, pois o seu professor havia lhe contado um pouco da história do prédio que, no passado, sediara a Escola Normal. Este, quando encontrou seu avô, começou a contar as histórias que tinha ouvido na aula de teatro. Com um sorriso caloroso, Arlindo virou-se para seu neto e falou:
— Eu sei, foi aqui que sua avó estudou. Já vivi tantas coisas nessa rua, que todas as vezes em que passo aqui não consigo esquecer.
Henrique, tomado por uma grande curiosidade, pediu para seu avô lhe contar um pouco dessas histórias. Arlindo, então, convidou seu neto para caminhar pela Conselheiro Franco e começou a narrar o que lhe vinha à memória:
—Meu querido neto, a memória é um livro antigo mágico, o qual eu não me canso de ler; é como se eu pudesse me transportar para suas páginas, para a Feira de Santana da minha mocidade. Inicialmente, tudo acontecia na Rua Conselheiro Franco, “a rua movimento”, antiga Rua Direita. Ao longo desta via, localizavam-se as sedes das filarmônicas, a Escola Normal, o Grêmio Rio Branco, a Pensão Universal, o Clube Coreográfico Dois de Julho e o Cine-Teatro Santana. Seguindo a direção sul, chegava-se à Igreja Matriz e à grande praça ajardinada com seu coreto, palco de diversas manifestações; ao norte, o destino seria a Igreja dos Remédios. Apesar de fazer fronteira, de um ponto ao outro, com grandes marcos religiosos da cidade, tal espaço, em seus passeios e prédios, era cenário para diversões, diferentes bailes, espetáculos teatrais, sessões de filmes, folias de Momo, palestras e saraus, além, é claro, dos próprios festejos religiosos. Assim era a Rua Direita, que, nas três primeiras décadas do século XX, concentrava as agremiações culturais da urbe feirense.
Seu Arlindo continuou:
— Mas foi na porta do Cine-Teatro Santana que eu vi sua avó Antônia pela primeira vez: ela estava acompanhada da tia solteirona, Izabel, e da sua prima Sofia. Ai, aquele Cinema! Tantas recordações... tantas alegrias... lugar que me fazia viajar sem sair das poltronas. Na década de 1920, havia também o Cine Brasil, porém era o Santana que causava furor nos jovens da cidade. Até onde minha mãe, Dona Arlinda Sampaio, me contava, o Teatro Santana datava mais ou menos do início da década de 1840 do século XIX, quando foi mencionado “em uma correspondência oficial endereçada à Câmara local, a orientação para que fossem realizadas, no referido teatro, as sessões legislativas”, visto que, nesse período, a Câmara não tinha local específico para realizar seus trabalhos. Em 1919, passou a ser o sucessor do Cinema Vitória, sendo chamado de Cine-Teatro Santana, porque, além dos espetáculos teatrais, foram incorporadas as exibições de filmes. Situado na esquina da antiga Rua Direita (atual Rua Conselheiro Franco) com a Rua 24 de Maio, num terreno pertencente à Santa Casa de Misericórdia, que arrendava o prédio para quem quisesse explorar as funções comerciais do estabelecimento. Posso citar como arrendatários do Cine-Teatro Santana: Raul Ferreira da Silva, José Calmon de Siqueira e Elziario Santana.

Nova fachada do Cine-Teatro Santana
Fonte: acervo particular do santanopolitano
Carlos Alberto Mello 
Arlindo prosseguiu:
— Segundo a senhora minha mãe, na década de 1920 quem tomava conta do saudoso Santana era o senhor Raul Ferreira da Silva, que na época era diretor do jornal Folha do Norte, irmão do político Arnold Silva. Pelo que se soube na cidade, o senhor Raul F. da Silva enfrentou algumas dificuldades, a exemplo de problemas técnicos com os cinematógrafos. Antes que você me pergunte o que é um cinematógrafo, eu lhe explico, Henrique. O cinematógrafo era a máquina que projetava a imagem na tela. Mas, voltemos ao senhor Raul: este ainda tinha que enfrentar a concorrência com o Cine Brasil, pertencente ao Sr. Francisco Soares Bahia, sobrinho do Cel. Bernardino Bahia - o que teria contribuído para que as finanças do Cine-Teatro Santana nesse período fossem conturbadas. Essa disputa acabou por fechar os dois estabelecimentos, tanto o Cine Brasil quanto o Cine-Teatro Santana, o que fez seu Raul F. da Silva passar o arrendamento do Santana para outra pessoa. No início da década de 1930, o Cine-Teatro passou a ser arrendado pelo Sr. Calmon de Siqueira, que realizou uma reforma das instalações, trocando seu mobiliário e instalando equipamentos, justamente para as exibições dos filmes falados, uma novidade naquela época, visto que os filmes exibidos antes, eram mudos.
Divulgação de um filme,
Fonte:Museu Casa do Sertão
Henrique, com uma cara de espanto, interrompeu seu avô:
—Fala sério, vô! Eu não acredito! Filmes mudos!
    Dando uma risada, Arlindo retomou a fala:
—Sei que para você, que vive no meio dessas parafernálias que a modernidade inventou, é difícil acreditar. Um dia desses vamos assistir a um filme mudo de um dos maiores atores do cinema, Charlie Chaplin. Voltemos à historinha do Cine-Santana, que, na década de 1930, reinou pleno. O Sr. Calmon, entretanto, acabou sendo nomeado para o cargo de escrivão do Tribunal de Contas em Salvador, o que o impossibilitou de continuar administrando o Cine-Teatro Santana, que, mais uma vez, mudava de mãos. Em 1938, quando eu comecei a frequentar as matinés do cinema, quem o dirigia era o Sr. Elziario Santana, membro do Grêmio Dramático Salles Barbosa. Eu me lembro bem que no anúncio de reinauguração tinha o filme O Rei e a Corista, e nas semanas seguintes Cleópatra (1938) e Robin Hood (1938). Nas sessões destinadas às crianças, aconteciam sorteios de brindes; aos domingos, havia uma sessão chique onde se exigiam os melhores trajes, e, algumas vezes, o público era recepcionado com uma banda musical - diferentemente das sessões ocorridas nas segundas- feiras populares. Henrique, nas segundas-feiras é que era diversão, pois era o dia em que, geralmente, passavam as sessões dos meus filmes prediletos: os de faroeste, ou melhor, de dizer, de cowboys, com o ator Tom Mix, e os de terror com Bela Lugosi. Eram sessões lotadas e agitadas, com uma verdadeira gritaria na plateia, que torcia pelo mocinho. Mas confesso que nas minhas idas ao Santana, o que mais me marcou foi assistir às séries de Flash Gordon, com os foguetes e as pistolas; eu ficava fascinado, viajando naquela ficção. Henrique interrompeu-o novamente:
—Vô, esse tal de Flash Gordon é tipo um super-herói, como o Homem de Ferro?

 Arlindo acenou com a cabeça, afirmando que sim. A caminhada dos dois termina. Henrique, com os pensamentos fervilhando após tantas informações, perguntou:
—Um dia desses me mostra onde fica esse Cine-Teatro Santana?
Arlindo, com os olhos emaranhados pela tristeza, respondeu:
—Já estamos de frente para ele.
Henrique, confuso, disse:
—Vô, está ficando maluco? Aqui não tem nada, a não ser o estacionamento de carros.
Arlindo respondeu:
—Pois é, antigamente ele ficava aqui, mas já não existe mais, a não ser na minha memória. A máquina da modernidade, há muito tempo, vem demolindo pedaços da nossa história.
Henrique:
—Que triste, eu queria explorar o lugar em que você conheceu a vovó, saber qual era o filme que estava passando na época.
Arlindo:
—Não foi numa sessão de filmes, foi em uma apresentação do grupo dramático Taborda. Só que essa história é para outro dia; vou deixar que a sua avó lhe conte, afinal, ela era uma das fãs do Taborda.

Foto interna do Cine-teatro Santana. Fonte acervo particular
do santanopolitano Carlos Mello provavelmente
se refere a década de 40.
Aline Aguiar Cerqueira dos Santos












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