Símbolos do Santanópolis

FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

SANTANOPOLITANDO COM A VIDA

Jean Parente
Santanopolitano
          O dia já estava amanhecendo, quando preguiçosamente me levantei para trocar de roupa e me arrumar para enfrentar mais um dia na vida de um adolescente. Eu tinha doze anos, e sentia dificuldades para ajeitar o meu cabelo, desarrumado pelo vento e ressecado pelas águas das piscinas. Como o Clube era próximo a minha casa, quase todos os dias eu e meus irmãos estávamos lá. Íamos para a escola, fazíamos os deveres de casa, e depois, piscina. Era muito bom, nos divertíamos bastante e fazíamos novos amigos.
          O colégio onde estudávamos, eu e mais dois irmãos, ficava no centro da cidade, vizinho a Prefeitura Municipal. Era o Colégio Santanópolis. Íamos andando de casa até lá. Era uma caminhada tranquila pelas ruas da cidade, onde apreciávamos as árvores, as casas com as suas roseiras na frente, as quais se exibiam abertamente, sem precisar de altos muros para protegê-las, pois as  pessoas respeitavam as coisas e os espaços alheios. Quando queriam arrancar uma rosa para oferecer a sua mãe, ou até mesmo a pessoa amada, simplesmente pedia aos donos da casa, que cediam educadamente e com muita satisfação. Simples assim, e tudo funcionava.
          Era o ano de 1972, onde não tínhamos medo de andar pelas ruas, brincar, visitar alguém e ficar nas portas conversando até tarde. Tínhamos tempo e a oportunidade de admirarmos a lua e as estrelas, a chuva que caia, o canto das cigarras no final da tarde, e até mesmo as andorinhas no seu vôo majestoso pelos céus da nossa cidade, as quais, inocentemente tentávamos contar nos dedos.
          Durante a nossa caminhada ao colégio, cumprimentávamos as pessoas nas portas de casa, como diziam, as quais sempre perguntavam e mandavam lembranças aos nossos pais. Passávamos pela casa dos nossos avós, que, quando não estavam na varanda, frente a casa, entrávamos rapidamente e pediamos a bênção, num sinal de respeito e consideração. Era muito importante para nós e para eles, assim como, para um amigo que morava na mesma rua, paraplégico, que sempre esperava a gente passar para uma breve conversa, já que ele quase não saia de casa. E dava tempo para tudo, era incrível. 
          Lembro-me que, na volta pra casa, vínhamos conversando com um grupo de colegas, onde passávamos na Padaria Universo, próxima ao colégio, e comprávamos pão-de-açúcar, o qual vínhamos comendo até chegar em casa, e nos divertindo com um colega que comia até parte do guardanapo de tão desastrado que era, ainda sujando o rosto de açúcar. Era tão engraçado que ele mesmo ria da situação.
          Mas, enfim, quando chegávamos ao colégio, tinha o porteiro, que arrumadamente se posicionava em frente a uma guarita, conferindo atentamente o uniforme de todos. Uniforme incompleto ou fora do padrão, tinha que passar pela secretaria ou voltar para casa para se arrumar direito. Todos obedeciam e cumpriam a determinação sem ficar aborrecidos, pois os pais respeitavam e apoiavam as exigências do colégio, e sabiam que era para o bem de todos, onde a disciplina já começava por ali.
          Era uma alegria muito grande quando íamos para o colégio. Nos sentíamos bem, felizes e amados. Com um espaço fantasticamente arborizado, ficávamos durante os intervalos sob a sombra de uma árvore, que nos proporcionava uma leve brisa de outono, onde tinhamos tempo para conversar e nos conhecermos melhor. Tínhamos um colega que adorava ouro, e sempre nos oferecia para comprar uma correntinha ou um pingente. Como éramos adolescentes, e sem dinheiro, ninguém comprava nada. Parecia que ele era pernambucano, pois tinha um jeito de falar bem diferente e engraçado, que  a gente até brincava com ele dizendo que não era ouro, e sim, apenas pintado de amarelo. 
          De vez em quando, ouvíamos o som da Banda do colégio ensaiando, a qual nos encantava com as músicas que tocariam nas apresentações e desfiles do sete de setembro pelas ruas da cidade. Era maravilhoso sentir a emoção, a dedicação e o entusiasmo de todos para fazerem uma boa apresentação, os quais eram sempre convidados para outros eventos fora do colégio.
          Lembro-me de um laboratório que tinha um caranguejo enorme, e um feto que ficava dentro de um recipiente de vidro, que eu morria de medo que ele abrisse os olhos. O local me atraía,  e me deixava curioso pelas coisas apresentadas, as quais fascinavam a todos os meus colegas que adoravam as aulas de ciências. Éramos apaixonados por uma professora de Educação Moral e Cívica chamada Fatinha, a qual era sempre gentil e amorosa, linda, discreta e paciente, que  deixava todos os alunos mais velhos, e também os mais novos, apaixonados pelo seu jeito de ser, e também quando admiravam as suas lindas pernas, apesar do discreto vestido. Isso eu ouvia dos colegas mais assanhados e no meio da adolescência, onde parecia que os hormônios estavam a todo vapor. 
Escritório Modelo Santanópolis
Foto - arquivo de  Jean
           Nesta fase, nos apaixonávamos facilmente. Ficávamos olhando discretamente para as colegas, e tentava um olhar direto com um leve sorriso. A gente namorava com os olhos, com o coração e com a emoção. Viajávamos no maravilhoso mundo da fantasia e do desejo, despertando sonhos inimagináveis. Muitas vezes nos apaixonávamos por alguém, que nem sabia das nossas intenções. Mas, nos apaixonávamos assim mesmo, e até sofríamos por um amor não correspondido, onde procurávamos uma linda música romântica para ouví-la pensando na pessoa desejada. Era a pureza da adolescência prevalecendo sobre a maturidade da paixão e da malícia.
          Nunca esqueci de uma outra professora, Ivanilde, de Português, a qual me elogiou e incentivou a desenvolver uma aptidão que já tinha naquela idade, onde eu escrevia e desenhava histórias em quadrinhos, pedindo até para criar e desenhar a capa de um jornalzinho do colégio, com o nome de "O K louro", o qual me fez sentir muito importante. Ela era maravilhosamente gentil e atenciosa, demonstrando um carinho e uma atenção muito grande pelo meu talento e pela minha criatividade infantil. Nunca a esqueci.
          Sei que tive outras professoras, e que também foram importantes para mim, pois a direção do colégio sempre se preocupava em escolher os melhores profissionais, já que tinha uma proposta inovadora de educação no município de Feira de Santana, interior da Bahia, formando até oito alunos que foram prefeitos da cidade.
          Fundado em agosto de 1933, o Colégio Santanópolis foi o primeiro colégio ginasial do interior da Bahia, dando a cidade o status de referência educacional, e que tinha até um internato para receber alunos de outras regiões do estado. Além disso, teve a segunda quadra coberta do estado, e a primeira do interior na década de 40, onde realizavam os bailes com os homens todos de smoking, e as mulheres com lindos vestidos. Gostaria muito de ter vivido naquela época. 
          Na verdade, o colégio que funcionou até 1985 , marcou toda uma época e uma geração na cidade, onde até hoje, cerca de quinhentas pessoas, entre ex-funcionários, professores e alunos se encontram numa grande confraternização, relembrando os grandes momentos vividos na instituição. Cheguei até participar de uma dessas festas, e encontrar uma antiga colega que não via há mais de quarenta anos, a qual só a reconheci porque ainda usava o mesmo penteado. Foi muito emocionante e divertido. Vi até um ex-prefeito que tinha o nome em colégio da cidade, por volta dos seus noventa anos, o qual me deixou muito emocionado, pois achava que ele não estivesse mais vivo. Foi maravilhoso também, encontrar professoras e diretores que eu tinha convivido na minha adolescência, e que foram responsáveis pela minha formação, e conversar com eles já como adulto, trocando ideias atuais e relembrando os velhos tempos.
          Assim, guardo nas lembranças, momentos vividos e jamais esquecidos quando estudei no Colégio Santanópolis, onde, na busca do conhecimento, também encontrei  amigos e amigas  para uma vida inteira, trazendo sempre para nós, momentos de carinho, amor e atenção, os quais passaremos para os nossos filhos, e eles para os filhos deles e assim por diante, na esperança de tornarmos um mundo melhor.

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