As revoltas explodiam em diversos lugares, e, em 1821,
no Arraial da Ponta da Baleia, hoje Itaparica, o cirurgião Luiz Gonzaga da Luz
criou a Campanha da Independência, onde se alistou Maria Felipa. Integrada à
luta, tempos depois, vamos encontrá-la, liderando 40 valentes mulheres, na
Praia de Manguinhos, onde estava ancorada a Canhoneira Dez de Fevereiro. Era o
dia Io de outubro de 1822. Este dia ficaria marcado por nele ter
ocorrido o primeiro dos ataques nativos às 42 embarcações portuguesas. A líder,
Maria, chamou duas das suas comandadas e ordenou que estas chegassem próximas
dos vigias da canhoneira, os portugueses Araújo Mendes e Guimarães das Uvas,
atraindo-os para uma armadilha. Esbanjando feminilidade as nativas seduziram os
vigias, conduzindo-os para um local um pouco distante, com promessa de sexo
fácil. Os homens, ao tirar as roupas, foram surpreendidos por um grupo de
mulheres que os surraram com galhos da planta chamada cansanção, repletos de
espinhos. Após acabar com a vigília dos invasores, as “vendetas” (era assim
chamado o bando de mulheres liderado por Maria Felipa) tomaram o navio de surpresa,
enquanto a maioria dos tripulantes dormia, e atearam fogo à embarcação.
Depois do sucesso desta missão, as “vendetas”, lideradas por Maria
Felipa, ganharam o respeito e a companhia de homens nativos, mulatos e índios.
Unidos, partiram para a destruição das embarcações portuguesas, ancoradas nas
imediações da ilha, que aguardavam a ordem para invadir Salvador e reprimir as
ações pela independência baiana. Sorrateiramente, os guerrilheiros se
aproximavam dos navios e os incendiavam, causando baixas significativas na
marinha portuguesa. Incansável, Felipa estava sempre à frente do seu pequeno
exército mambembe, sendo suas maiores armas o denodo e o desassombro. Conta-nos
Xavier Marques em seu romance “O Sargento Pedro” que os homens estavam se
preparando para enfrentar um ataque português cavando uma trincheira na praia,
iluminados apenas por uma tocha em mãos de Maria quando um deles disse: Estou
cavando a minha cova!” ao que, de pronto, a mulher respondeu: Cave, não para
ser a sua cova, mas a dos portugueses...”
Itaparica conseguiu resistir a quatro assaltos, um atrás do outro, graças à tenacidade e uma organização de guerrilha: quando os portugueses estavam chegando, eles mandavam sinais, se escondendo nas trincheiras cavadas na praia.
Capas de livros que contam sobre Maria Felipa |
Incansável, ajudando ao tenente João das Botas, Maria Felipa estava em todos os lugares à frente dos seus combatentes. Além dos feitos de batalha, ainda distribuía mantimentos tomados dos inimigos, enviando-os para cidades do Recôncavo, como Santo Amaro, Santo Antônio de Jesus, Amargosa, Nazaré, Salinas das Margaridas, Cruz das Almas e outras. Portando armas simples e galhos de cansanção, e incendiando navios com tochas feitas de palha de coco e chumbo, à falta de armas mais eficientes, tornou-se o povo itaparicano fundamental para a Independência da Bahia e do Brasil. O pequeno exército de moradores era formado por um grupo de mulheres e homens de diferentes etnias: brancos, negros, mulatos, índios, enfim todos os que quisessem resistir aos invasores. São muitos os feitos desta mulher e foram inúmeros os desafetos que acumulou por seu denodo e bravura.
Diversas são as histórias que se contam sobre a participação dos ilhéus de Itaparica. São fatos que enchem de orgulho o povo nativo por seu papel na libertação brasileira do jugo português.
HISTÓRIAS E LENDAS
Algumas delas: Uma imagem de Nossa Senhora da Piedade foi trazida para a ilha e depositada em um nicho na praia pelo Visconde do Rio Vermelho. Era Nossa Senhora da Piedade, a protetora dos pescadores, marisqueiras e de toda a população pobre da ilha. Estes a veneravam em todos os momentos: Antes de ir pescar, quando os filhos nasciam, na hora da morte, os nativos sempre pediam socorro à santa. Contam os mais entusiasmados, o que naturalmente se tomou uma lenda itaparicana: Nossa Senhora, em pessoa, lutou contra os portugueses em defesa do povo da Ilha. Alguns chegam a afirmar ter acontecido a intervenção divina no processo de Independência, porque no ano de 1823 viram uma mulher que, ao levantar os braços, fazia as balas de canhão cairem ao mar sem alcançar terra firme. “Os nativos juram que não sabiam de quem se tratava até que, ao fim do dia, deram-se conta de que o Oratório de Nossa Senhora da Piedade estava aberto e a imagem estava suja com a areia da praia”, afirma Augusto Albuquerque. Lendas ou não, quando o visconde morreu, seus descendentes quiseram retirar a imagem do nicho na pedra, onde se encontrava por gerações e gerações. Quando a polícia foi cumprir as ordens de sequestro da santa, Maria Felipa e suas seguidoras se postaram diante da imagem, impedindo isto e faltou coragem aos militares para tirar Nossa Senhora da Piedade do seu lugar. Aliás, a santa ainda está no altar da capela construída em honra da padroeira...
Relatam ainda: ela, Maria Felipa,
costumava remar sua canoa onde ficava sabendo das novidades sobre a guerra,
levando as informações de volta à resistência em Itaparica. Quanto ao seu rosto
desconhecido, numa tentativa de reconstitui-lo, a artística plástica Filomena
Orge o fez a partir de memórias narradas, citações literárias e arqueologia.
CONCLUSÃO
Maria Felipa por Filomena Orge |
Transcrito da Rev. IHGFS -E de Santana-N. 16
Nenhum comentário:
Postar um comentário