ASSUMINDO
[...] Bastante inseguro
esem a maior tendência po lítica, esse nosso coronel Salú. Mas ele estava gos tando da nova função de tirano da
revolução. Vocês vão ver como o poder modifica um homem [...]
A TERÇA-FEIRA AMANHECE
Como de costume,
coronel Salustiano acordou cedo, se arrumou melhor que nos outros dias e saiu
da fazenda sozinho. Ao chegar à cidade, deu algumas voltas pela praça,
verificou outras ruas e seguiu em direção ao velho armazém de fumo, onde estavam os presos. Estacionou seu Jeep
do lado de fora e entrou, mas não sem antes falar com os sentinelas de plantão
na entrada.
Ao checar tudo em
volta, foi até o lugar das celas e encontrou o ex-prefeito Gilberto, sentado
no chão, de frente para as grades. O coronel parou, olhou em volta, encarou o
ex-prefeito e lhe deu um bom-dia sem fitá-lo.
-
Bom-dia Sr. Gilberto.
O ex-prefeito
respondeu friamente.
-
Bom-dia.
-
Como passou a noite?
-
Deixa de ironia, coronel...
-
O senhor está precisando de alguma coisa?
O ex-prefeito
sabia que brigar naquela hora seria pior, melhor era levar aquela situação de
maneira calma.
-
Coronel, eu gostaria que o senhor avisasse a
minha família onde eu estou e o que aconteceu. Minha mulher e minha filha não
sabem de nada ainda. Por favor, faça isso.
O coronel
Salustiano concordou e saiu.
Durante o
percurso de volta até a cidade, encontrou com o capitão Duarte na estrada e
pararam para conversar. Coronal Salú falou que iria até a casa do ex-prefeito
comunicar a sua prisão.
- Capitão, estou indo até a casa do ex-prefeito
avisar da sua prisão.
- Está bem coronel, faça isso, mas avise a
esposa dele que ela não poderá vir para cá. Mais tarde, nós definiremos o dia
de visitas.
O coronel seguiu
viagem, e ao entrar na cidade, encontrou com o vereador Anacleto Capanico
sentado num banco da praça. Parou o carro e perguntou:
- O senhor convocou a reunião para hoje?
- Já avisei a todos, mas Tonho da Cachorra
disse que não vai.
- Não vai?
- Disse que uma reunião convocada de forma
ditatorial não tem validade... Essas coisas.
- Pois vá dizer a ele que se não for eu vou
mandar prender. E qualquer um que faltar a esta convocação será preso
imediatamente. Vá e diga isso. Quero todos os vereadores na câmara hoje à
tarde.
- Sim, senhor. Vou avisar um por um.
O coronel seguiu
na sua missão de avisar a D. Catuta e Maria Flor. Parou o carro em frente à
porta da casa e uma janela se abriu. Era Maria Flor.
O coronel desceu
do carro e cumprimentou a moça.
- Bom-dia Maria Flor, sua mãe está em casa.
- Está sim, coronel. Vou chamar.
D. Catuta veio
receber o coronel. Abriu a porta e mandou que ele entrasse. Já dentro da casa o
coronel foi logo falando.
- D. Catuta, o Gilberto está preso.
D. Catuta, com
olhar espantado se sentou.
- Preso? Mas por quê?
- A senhora sabe que os militares é quem estão
mandando no país. Fizeram a revolução pra acabar com a baderna política que estava
tornando tudo muito inseguro. Era necessário coibir certas reformas que queriam
fazer. O presidente João Goulart foi exilado, muita gente foi presa. Mas eu
asseguro que está tudo bem com ele. Logo estará solto. Acredite em mim.
- Eu sabia que isso ia acontecer. Tanto que
falei pra ele não se meter em política.
- Fica tranquila D. Catuta, nada de ruim vai
acontecer.
- E onde ele está? Preciso ir lá, levar alguma
coisa pra ele comer...
- Não, D. Catuta, a senhora não poderá ir lá,
só depois que o pessoal do exército liberar pra visita. Por enquanto, não faça
nada.
- Pelo menos me diz onde ele está.
- No momento não posso, mas fica tranquila que
quando eu puder falar, eu lhe direi onde ele está.
Despediu-se das
duas e notou que havia num quarto uma estante com alguns livros arrumados.
Sorriu e foi embora.
À tarde, o
coronel chegou à câmara de vereadores depois que todos já estavam esperando.
Foi uma estratégia montada pelo capitão Duarte. Havia um burburinho.
No plenário,
estavam todos os vereadores eleitos e empossados.
Na plateia, não
havia ninguém.
O coronel entrou
acompanhado do capitão e se sentaram bem na fila da frente. O presidente da
câmara, Tonho da Cachorra, abre a seção com a pauta da reunião. Enquanto ele
discursava, alguns soldados cercavam o prédio e fechavam as portas. O
presidente do legislativo interrompeu seu discurso dizendo:
- Senhores colegas vereadores, tenho que
informar que a câmara está sendo cercada por soldados do Exército. Gostaria de
cobrar uma explicação, afinal aqui é a casa da cidadania e da democracia.
Exijo uma explicação.
O capitão
levantou-se, e disse alto:
- Por enquanto ninguém entra e ninguém sai
daqui.
- Podemos saber o que está acontecendo? - Perguntou
Tonho da Cachorra.
O capitão
prosseguiu:
- Esta reunião foi convocada de acordo com o
artigo 6, pará-grafo 2 inciso terceiro da lei de exceção imposta pelo Ato
Institucional n°. 1, que nomeia o novo prefeito desta cidade, o senhor Salustiano Agamenon Supimpa dos Santos, que deverá tomar posse nesta reunião.
Gostaria que constasse em ata desta assembleia o termo de posse assinado por
todos os presentes e sem ressalvas.
O secretário da
Câmara lavrou o termo de posse e todos assinaram sob as vistas do capitão e do
coronel. Logo após a solenidade de posse o Capitão Duarte decretou a prisão
dos vereadores: Tonho da Cachorra, Carlito Bacalhau e Tonho Capenga, todos
acusados de subversão da ordem e de participarem de células comunistas. O mais
implicado era Tonho da Cachorra, pois havia informações de que ele fazia parte
do Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR8)
Os soldados
invadiram o recinto, algemaram os três acusados e levaram para dentro de um
caminhão do exercito.
Estava assim empossado de fato
e de direito o coronel Salustiano, agora prefeito do Município de Nossa
Senhora das Dores.
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