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FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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sábado, 29 de janeiro de 2022

POLÍTICA DE ANTÃO - II

MARCOS PÉRSICO – Santanopolitano, cineasta, teatrólogo, escritor.

POLÍTICA DE ANTÃO - I

O COMÍCIO

{...) SÓ SE OUVE o povo balbuciando palavras vãs. O palanque está lotado de puxa-sacos, correligionários, políticos e papagaios de pirata.

Pra quem não sabe, papagaio de pirata é aquele intruso que fica aparecendo em todas as fotos, apenas com a cabeça por trás do ombro do candidato. Havia até revezamento desse tipo de ave de rapina.

O locutor pega o microfone, bate como se estivesse mandando todo mundo se foder, diz:

-     Alô... sooooom, tessstando, 123, sooooom. Ei soooom, Ahhli sooooom, tessstando 123. Ah!

Puxa o ar e anuncia:

-     Senhoras e senhores, moradores da cidade de Nossa Senhora das Dores, autoridades aqui presentes...

Faz-se um suspense. O tocador de caixa da banda rufa as ba quetas, aumentando a ansiedade do povo.

O locutor enfim anuncia.

-     Vai falar para o povo desta cidade o futuro prefeito... Coronel Salustiano...

O povo aplaude, porque o povo aplaude tudo...

Os fogos estouram, porque foram feitos para estourar nesses momentos.

Coronel Salustiano pega o microfone e, visivelmente, nervoso, diz:

-      Povo da minha terra...

O povo aplaude e grita.

Na verdade tinham alguns contratados pra puxar as palmas.

- É chegada a hora da mudança. Eu não poderia deixar de me oferecer a esta empreitada política, pra não ver sucumbir a nossa terra nas mãos do mal.

O delegado olha para o prefeito Serapião e enfezado comenta:

-      Lá vem chumbo prefeito, segura o cu que lá vem chumbo!

O coronel prossegue:

-     Há muito tempo eu tinha jurado pra mim mesmo e pra mi­nha família, que prezo tanto, não me meter em política e nem tam­pouco me candidatar a nenhum cargo.

O povo aplaude.

-     Mas, diante das circunstâncias desenhadas no presente, achei por bem preservar o futuro.

O povo não entendeu porra nenhuma, mas achou bonito. Povo adora metáfora de político.

Alguém se entusiasmou e gritou:

-      Muito bem!

O povo aplaudiu.

-     Todos sabem que sou filho desta terra, que amo a minha cidade, que jamais deixarei que forças ocultas atrapalhem o progresso (“forças ocultas” era a palavra da moda por causa da renúncia de Jânio).

O povo aplaude.

-     Não permitirei jamais que entravem o crescimento e o progresso da nossa terra. Não deixarei de fazer com que o povo se sinta orgulhoso de pertencer a uma cidade que precisa crescer.

-     Estamos há muito tempo, entregues nas mãos de políticos inescrupulosos, que quase nada estão fazendo para melhorar a vida da população de Nossa Senhora das Dores.

-     A nossa cidade necessita de obras, de melhoramentos, de escolas, de hospital, de saneamento, de água potável.

Nesse momento, o coronel se entusiasmou com as palavras e cometeu um deslize que nunca foi notado. Ele disse:

-     Vamos trabalhar sério. Vamos dotar a nossa cidade de água elétrica e luz encanada.

O povo aplaudiu com muito entusiasmo sem perceber o erro. Mas o povo é assim mesmo, nunca percebe os erros. -       Quero neste instante, diante do meu povo e na minha cida¬de, anunciar que sou candidato a prefeito e a partir de agora quero contar com o seu voto. Vamos caminhar juntos, pra fazer da nossa cidade um lugar agradável e sem atitudes arbitrárias que certas pessoas vêm praticando diante dos olhos do povo.

O delegado Gilberto deu um soco na janela e disse:

-    Agora ele me insultou. Isso não vai ficar assim. No meu comício, eu vou dizer poucas e boas desse safado.

O coronel encerrou.

-    Quero dizer que conto com o seu voto, conto com o meu povo e vamos ao encontro da vitória. No dia 07 de outubro, quero o seu voto. Muito obrigado.

O povo aplaudiu, entusiasmadamente. Os fogos estouraram. O coronel já havia contratado alguns homens para carregá-lo nos ombros e assim foi feito. Ele saiu carregado nos braços do povo que caminhou em volta da praça.

Assim, foi lançada a candidatura do coronel Salustiano a prefeito da sua cidade. Desse dia em diante, o coronel nunca mais conseguiu ser a mesma pessoa. Sua personalidade mudou.

Terminado o evento, Tonho da Cachorra e Manoel Doca chegam à casa do delegado.

O delegado, ainda zonzo com o barulho do alto-falante, pergunta pra Manoel Doca:

-    Posso saber o porquê da sua bandeada pro outro lado? Não está satisfeito com alguma coisa?

Manoel Doca, logo se servindo de um licor, responde:

-    Não bandeei coisa nenhuma... Estava apenas vendo quem realmente está do nosso lado, delegado.

-    Pra mim, isso é bandear, é virar a casaca, seu Manoel... O senhor já está do outro lado... Vai perder seu mandato de vereador... O senhor não se reelege.

-    Delegado, eu ainda estou no seu partido. Serei candidato à reeleição pelo seu partido.

-    Espero que seja verdade, seu Manoel.

O delegado, olhando bem firme pra Tonho da Cachorra, diz:

-    O senhor até anunciado foi... Eu mando o senhor ir buscar esse idiota e o senhor acaba ficando no palanque do adversário... Eu estou cercado de traíras, isso sim.

Tonho da Cachorra, com a boca cheia de amendoim cozido, fala cuspindo alguns grãos:

-    Hum... Delegado... Eu não tenho culpa daquele locutor me anunciar... Afinal, sou um homem popular. O senhor viu como o povo me aplaudiu?

-    Vi sim... E vi também como o senhor gostou de ter ficado do outro lado.

O prefeito Serapião pegou seu chapéu, se despediu de D. Catuta e de Maria Flor, chegou até a porta e falou ao delegado:

-    Vamos ter que trabalhar na surdina esse tempo todo. Pode escrever, vou colocar a máquina administrativa pra trabalhar pra sua eleição delegado. Essa nós não perdemos por dinheiro nenhum.

-    Espero que o senhor esteja certo do que está falando. Se eu lor depender desse bando de traidores...

O prefeito se despediu de todos e saiu acompanhado de Tonho da Cachorra e Manoel Doca,

Pedro Burrinha havia vomitado novamente e estava escornado num canto da sala, enquanto Boca de Sulapa comia um frango assado que havia encontrado no forno e seria servido no outro dia.

Maria Flor e D. Catuta já haviam se recolhido. O delegado chamou Boca de Sulapa:

-    Pega esse bêbado e tira ele daqui de dentro da minha casa, senão vai pegar mal eu ter que mandar prender um vereador por embriaguez.

Boca de Sulapa se abaixou, pegou Pedro Burrinha pelos braços e arrastou pra fora da casa do delegado.

O estado de Pedro Burrinha era tão lastimável, que ninguém percebeu que ele estava todo cagado, por isso o mau cheiro na casa toda.

O delegado Gilberto, mais que depressa, fechou a porta da casa e foi se recolher, pois o dia seguinte seria de articulações políticas.

(continua: O dia seguinte)

 

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