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FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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sábado, 18 de julho de 2020

AS HISTÓRIAS, AS CERTEZAS E AS SURPRESAS


RONALDO SENNA – Mestre, Doutor, Antropólogo, escritor, professor aposentado: Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Católica de Salvador (UCSAL).





Jamais conseguiremos escrever
As histórias dos futuros
E nem mesmo esconder
Os passados entre os muros.

Tendo suas próprias existências,
Seus fracassos e vitórias,
Suas razões e preferências
Tecem inconstantes memórias

Sendo a trajetória humana
Uma sucessão de erros insana
Apoiada na fé e na certeza,

Por mais segura que seja a gesta
A história sempre se manifesta
Pelos caminhos da surpresa

AS CONVICÇÕES OSCILANTES

As convicções estarão sempre oscilando ao sabor das circunstâncias, assim como as crenças só podem se estabelecer no bojo das heranças culturais. Por essas constatações apreendemos que as verdades se realizaram e sempre se realizarão no cerne das modificações contínuas e multidirecionadas. Instalar-se nessa panorâmica é a única forma objetiva e lógica de vermos o contínuo sociedade e cultura.
Essa herança em mutação, acionando a vida como é possível ser vivida, permite-nos ver que "eu sou eu e minhas circunstâncias" e que "o homem não tem natureza e sim história". Podemos dizer ainda, completando, que "não é a consciência que determina a existência, mas a existência que determina a consciência". Os dois primeiros pensamentos são de Ortega, o terceiro veio de Marx. Uma simples e atenta observação será o bastante para que uma identificação clara entre eles se torne patente e provoque, ainda mais, a nossa reflexão.
Sim, tanto a estrutura social (de onde nascem e vicejam as mais variadas conjunturas), como os contextos históricos (de onde saem os atos e eventualidades), são responsáveis pelos desfechos que direcionam o tempo e o espaço vivenciados.
Se as circunstâncias que envolvem um homem - ser histórico - são, por esta mesma história, construídas e - por esta construção - a sua consciência é trabalhada, este homem tem consciência, portanto, de que o ato de entender a sua vida tende sempre a ser o seu passado reorientado.
Inicia-se, por esta causa, o seu próprio projeto de vida. Ele nada mais é que uma das formas da sua consciência sendo determinada pela compreensão do mundo que recebe como herança das suas circunstâncias étnicas, económicas e socioculturais.
A partir da observação de tudo isso, o seu mundo se constrói. Este ser gerundial, esta realidade cinemática, ordena a consciência e arquiteta a determinação. O espaço no qual se estende o domínio do imaginário é o seu próprio projeto que se finaliza, em cada demarcação, instalando-se entre a Cosmologia e Cosmogonia.
Os conceitos de cosmologia e cosmogonia têm campos semânticos de tamanho desigual, tendendo o primeiro desses termos a englobar o segundo. Com efeito, o antropólogo pode definir a cosmologia como um conjunto de crenças e de conhecimentos, como um saber compósito, que abrange o universo natural e humano; a cosmogonia (parte da cosmologia centrada na criação do mundo), por seu lado, expõe, sob a forma de mitos as origens do cosmos e o processo de constituição da sociedade. Assim, a cosmologia - pela qual nos interessamos de maneira prioritária - apresenta-se como uma exigência de síntese, como a pesquisa duma visão totalizante do mundo. Além duma função redutora, uma vez que isola e dá importância a certos elementos considerados como constitutivos do universo, tem também uma função explicativa, pois ordena e põe em relação o meio natural e os traços culturais do grupo que a produziu. (Lallemand, 1974:27)
A cosmologia, portanto, procura logicizar o tempo e o espaço a partir de uma reflexão científica, no sentido objetivo e sistemático, dentro de um cálculo abrangente de possibilidades. Já a cosmogonia vê o universo, indubitavelmente como criatura, logo, tem que haver o criador. Produz, dessa forma, um painel rico em símbolos e metáforas. Para as mentes que se pretendem lógicas e coerentes, o espaço é sempre uma manifestação de área, lugar, distância, local, fronteira, delimitação (total ou parcial). "Já para o homem religiosos, o espaço não é homogêneo: apresenta roturas, quebras; há porções de espaço qualitativamente diferente dos outros" (Eliade, 1967:35).
Acompanhado a espacialização social, notamos que as ambientações se diferenciam, inclusive hierarquicamente, porque impregnadas de sagrado. Assim, vemos que em uma das nossas praças brasileiras em que exista uma igreja, aquele logradouro é mais sagrado que outros, a igreja mais sagrada que o restante da área, dentro da igreja, as naves mais sagradas do que o portal, o altar mais sagrado do que as naves e o sacrário mais sagrado do que o altar.
Tal como o espaço, o tempo também não é, para o homem religiosos, nem homogêneo nem contínuo. Há, por um lado, os intervalos de tempo sagrado, o tempo das festas (na sua grande maioria, festas periódicas); por outro lado, há o tempo profano, a duração temporal ordinária na qual se inscrevem os actos privados de significação religiosa. Entre estas duas espécies de tempo existem, bem entendido, solução de continuidade mas, por meio dos ritos, o homem religiosos pode “passar” sem perigo, da duração temporal ordinária para o
tempo sagrado. (Eliade, 1967:81).
A socialização do tempo constrói anos santos, meses santos, semanas santas, dias santos e, até horas santas. Mesmo quando as sacralizações não se manifestam como santificações, existem atos e eventos que possuem o poder de marcar o momento sagrado, como, por exemplo: o momento da escolha, a consciência da vocação, o desígnio da missão ou da sina, a romaria, a viagem à Meca, a sétima volta em torno da Caaba.
A cosmogonia é o modelo exemplar de toda espécie de fazer. Não só por ser o Cosmo o arquétipo ideal ao mesmo tempo de toda a criação, mas por ser uma obra divina. O Cosmo é, então, santificado na sua própria estrutura. Por extensão, tudo o que é perfeito, pleno, harmonioso, fértil, em uma palavra, tudo o que é concebido como um cosmo, tudo o que se parece a um cosmo, é sagrado. Fazer bem feita qualquer coisa, obrar, construir, estruturar, dar forma, informar, formar, tudo isso se resume em dizer que se faz com que alguma coisa comece a existir, que se dá vida a alguma coisa e, em última instância, que se faz com que alguma coisa se assemelhe ao organismo por excelência, o Cosmo. Ora, o Cosmo, não custa repetir, é a obra exemplar dos deuses, é a sua obra-prima (Eliane, 1967: 68).
O ser humano para se sentir semente, raiz e árvore da existência e não fruto da história, além de pôr os deuses a seu serviço, posiciona-se como centro do universo e, em consequência, coloca o cosmo como uma existência para o homem. Ora, se a vida (qualquer uma - não apenas a humana) desaparecesse não faria falta alguma ao universo. Não ver isso é apenas instalar-se em um tempo e espaço religiosos.



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