A fixação de um dos maiores
centros comerciais de gado no Brasil se dá em meados da metade do séc. XIX. O
gado vinha principalmente de Minas Gerais, Goiás e Piauí. Para se ter idéia do
volume comercializado. Em 1860, o gado,
especialmente o bovino, continuava a preponderar na feira semanal e na economia
de município de Feira de Santana. É provável que, por este tempo, se vendessem,
cada ano, na feira, 50.000 cabeças de bovinos[1].
Ainda de acordo com Poppino, não há modificações significativas na “feira de
gado” nos próximos 90 anos.
Vale registrar o movimento de 20
de outubro de 1880: entraram 600 rezes, para o consumo local 48, abateram-se
remetidas para capital, 300 e os demais para Cachoeira, Nazareth, Amargosa,
Matta do Cedro, Santo Amaro, São Gonçalo, Muritiba, arraial da Lapa e o resto
para solta. Entraram mais, 42 caprinos, 24 ovinos, 42 cavalos e 38 poldros.[2]
Se fizermos um pequeno cálculo, encontramos uma movimentação anual de mais de
40.000 cabeças ano (792 unidades vezes 52,14 semanas 41.297), ressaltamos que
neste exemplo só computamos as feiras de segundas-feiras, durante a semana
ainda existia negociações em pequena quantidade.
A localização geográfica de Feira
de Santana é o ponto crucial para torná-la um grande centro comercial do país,
inclusive sua origem foi determinada por rota de gados para comercialização
Vamos fixar a história da
comercialização da “feira de gado” no início do séc. XIX, daí priorizarmos o
período. Inicialmente a reunião de gados para negociação, se dava no “Olhos d'água”,
hoje Rua Paulo VI, nas imediações do “Casarão”, onde alguns historiadores
determinam como a primeira pousada dos
tropeiros. Ali é localizada a primeira feira de gado.
Como vimos acima, metade da
comercialização dos bovinos tinham como destino a cidade de Salvador, para
abate. Os “abatedores” [3] que adquiriam as reses para abate, enviavam um “positivo”, vaqueiro que ia antecipadamente ao matadouro da
Capital, para confirmar e agendar a matança; separar currais, negociar com as
“fateiras” [4]
e açougueiros, transporte das carnes etc.
Comparando-se com os padrões modernos, o
gado de 1860 era um fornecedor pobre de carne. Muito raramente um espécime
nobre pesava mais do que mil libras[5]
(15 @ 450 kg. peso vivo) [6],
e esse animal, provavelmente, não daria
mais do que trezentas libras (136 kg.
30%) de carcaça[7],
dura e sem sabor. A maior parte do peso
bruto era representada pelo couro e pelos ossos e chifres[8].
Atualmente o peso médio de abate é de 17@ (510 kg. pv.), o aproveitamento
de carcaça é de média 51% (260 kg.) É na
qualidade e no aproveitamento da carne, a grande evolução Os bovinos para abate
tinham idade 6 a 7 anos, hoje a média é de 3 anos. Em relação ao peso era mais
leve que os atuais. Mas a grande diferença para os tempos atuais está na
qualidade e rentabilidade da carcaça. Ainda prevalecia a mestiçagem do gado
Zebu com o “pé duro”, com idade de abate em média de seis anos, atualmente três
anos, consequentemente carne dura, com muito sebo (ver figura acima).
No início da
vinda do gado europeu, como citamos anteriormente, a prioridade não era a alimentação,
também não existia muito consumo, tudo girava na atividade principal, as
moendas de cana de açúcar. Eram muitas, em 1820 a Bahia possuía 600 moendas pequenas, médias e grandes, produzindo rapadura, cachaça, mel e principalmente açucar.
No Império até
o início do séc. XIX, as moendas distribuíam as carnes da seguinte forma: as
de primeira, traseiro do bovino, para casa grande, o dianteiro e chupa molho (carne de 2ª e 3ª)
destinados aos serviçais da casa, inclusive escravos, a estes eram
complementado com as CVS – bucho, buchinho, qualheira, carne de garganta,
coração, miolos, rabo, mocotó, fígado, passarinha – havia uma hierarquia na
distribuição de produtos bovinos, as partes nobres para os senhores feudais,
quanto mais à qualidade caia ia se impondo aos mais graduados até aos escravos
da lavoura que não tinham nenhuma especialidade. É importante salientar, a
parte nobre, traseira do animal, naquela época participava de menos de
40% do peso da carcaça, hoje são 49%.
A arte-culinária
desenvolvida pelos escravos transformou as vísceras em verdadeiras iguarias, inserida hoje no cardápio baiano: buchada,
mocotó, fígado, coração, mininico, etc. A Coperfeira (Cooperativa Pecuária de
Feira de Santana), tinha um cliente da cidade de Maragojipe, região do
Recôncavo baiano, que adquiria meia tonelada por semana de vísceras, principalmente mocotó, nos anos 90.
[1]
Poppino, Rollie E. “História da pecuária da região de Feira de Santana”.
[2] “O Motor”, jornal diário de Feira de Santana,
de 20 de outubro de 1880.
[3] Abatedor: adquirente do gado, primeira pessoa
na comercialização de bovinos para abate antigamente. Hoje é comum na Bahia
existir mais uma figura, o comprador. Mais adiante destrincharemos todas as
personalidades envolvidas no sistema. N.A.
[4]
Fateira: atividade de receber o conjunto de vísceras; coração, bucho, fígado,
livro, mocotó etc. Lavar limpar, o que acontecia em um rio próximo aos
matadouros, em Salvador tomou o nome de “Rios das Tripas”. N.A.
[5]
Poppino, Rollie E. “História da pecuária da região de Feira de Santana”.
[6]
Correspondência em quilograma e arroba, uma arroba corresponde a 15 Kg., mas
calcula-se o peso vivo com arroba de 30 kg. em geral a carcaça (parte da carne
comestível direta), equivale a 50% do peso vivo, portanto quando falarmos unidade
de arroba, para o caso de bovinos o peso vivo será igual a 30 kg. - N.A.
[7]
Idem, ibidem
[8]
Poppino, Rollie E. “História da pecuária da região de Feira de Santana”.
Como reconheceu que a foto foi tirada na Rua Paulo VI junto ao Casarão dos Olhos D'água?
ResponderExcluirA primeira edificação à esquerda, separa o vão onde os Pedras dizem era a guarida dos tropeiros.
ResponderExcluirConsultei o Santanopolitano historiador Carlos Melo, que confirmou ser a "fiera de gado" nas imediações. Gama outro historiador feirense, relata ter sido a primeira "feira de gado".
Mas estamos em aberto para mais informações que reafirmem ou colidem com o texto.