Hugo Navarro da Silva |
Supõe-se, hoje, que o prestígio do Diabo anda em decadência,
afastado do imaginário popular e anulada sua maléfica influência pelas
conquistas da civilização. Satanás e sua
aterrorizante atividade sobre os seres humanos estariam, assim, restritos a certos
setores da vida religiosa, agindo como azeite em fechaduras de cofres e dedos
leves em bolsos e contas bancárias. A suposição, entretanto, pode encerrar
fatal engano. Poeta maldito, acusado, entre outras coisas, de pacto com o
Diabo, Charles Baudelaire escreveu que “A mais bela manha do Diabo é
persuadir-nos de que não existe”. Baudelaire, aliás, faz parte de seleto grupo
de importantes nomes da literatura, da história e das artes em geral de propagandista
da existência do Demônio, não raras vezes havido por símbolo de rebeldia e
liberdade. No rol dos adoradores estão malucos, músicos, assassinos,
sacerdotes, romancistas, poetas e soldados, a exemplo do lugar-tenente de Joana
d’Arc, um certo Gilles de Rais, morto na
fogueira com a sua chefe. Interessante é que em todos os repositórios
de adoradores e seguidores do Diabo não há políticos, escondidos, certamente,
ou por suas artes infernais ou pela blindagem que a chefia lhes impõe.
Conhecido escritor brasileiro, Raimundo Magalhães Jr. Publicou,
em dois tomos, “antologia das melhores histórias diabólicas de todos os
tempos”, na qual figuram, entre muitos outros, Tolstoi, João Ribeiro, Andreyev,
Rubem Braga, Herculano e Machado de Assis, autor de “A Igreja do Diabo”,
contando como o Sujo, apesar dos lucros, sentindo-se humilhado pela desordem em que andava envolvido, resolveu colocar tudo nos trilhos organizando uma igreja. O conto supostamente baseia-se em
velho manuscrito beneditino.
Mas, de onde vem essa figura, o Diabo, que oscila entre o
humorístico e o trágico, que faz rir e estaria por trás de todas as desgraças
humanas? Talvez da necessidade da religião, a de ter bode expiatório para levar
a culpa de tudo que de ruim ocorre no mundo.
A antiguidade conheceu
o Diabo, em diversas formas, todas, entretanto, de origem divina. No Egito
havia Set, o deus da escuridão, do mal. Os persas conviveram com Ariman ou
Amramayu, filho de um mortal, Zarathustra, o profeta, que tenta matar.
Transforma-se em um deus destruidor. Na Índia o diabo era chamado de Mara, que
teria tentado Buda a ingressar no pecado. Mas, ao contrário do Satanás da
civilização cristã, Mara é o deus do amor, do gozo erótico, da embriaguez, do
domínio dos sentidos que leva à morte. Os gregos tiveram seus demônios, como os
romanos. Na Grécia, os Titãs se revoltaram contra o Olimpo da mesma forma como
os anjos se rebelaram contra Deus na lenda judaico-cristã, e um deles, Tifeu,
assumiu a vanguarda da maldade e do mundo das trevas, representado por um homem
com a cabeça de cobra. A Grécia foi a terra dos “daimons”. Cada ser humano
tinha o seu. Muçulmanos também possuíam (e possuem) seus demônios, o Iblis ou
saitan, também revoltado contra Deus por ter dado muito prestígio ao homem,
criado da lama, ao contrario de Iblis, criado do fogo.
No nordeste são famosas as histórias envolvendo o Diabo, nas
cresças populares, no anedotário popular e na literatura de cordel, provocando
terror em muita gente, dando enorme importância ao chamado pacto com o Diabo,
que alguns faziam para enriquecer. Nesta cidade cidadão famoso carregou para o
túmulo e fama de ter pactuado riquezas com o demônio em troca da alma. Muita
gente evitava sua última morada no Cemitério Piedade.
Apesar do Papa Paulo VI ter
afirmado que o Diabo é invisível, Satanás pode ser detectado, claramente, em
certas alianças ou pactos políticos. Alguns são perigosos. Podem fazer da
existência da vítima o diabo a quatro.
Hugo Navarro da
Silva - Santanopolitano, foi aluno e professor do Colégio Santanópolis.
Advogado, jornalista escreve para o "Jornal Folha do Norte".
Gentilmente, a nosso pedido, envia semanalmente a matéria produzida
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