Hugo Navarro Silva |
O assombroso desenvolvimento mundial, puxado,
principalmente, pelos produtos eletrônicos, que hoje empolgam a humanidade e
provocam mudanças que há quarenta ou cinquenta anos ninguém seria capaz de
prever, atinge, profundamente, os costumes, hábitos e aspectos desta cidade, em
outros tempos lugar aprazível e tranquilo, descrito, pela poetisa, como formoso
e bendito, “terra moça de sã natureza”. No dizer do povo, “já era”.
Assim, temos que nos conformar com o inevitável e manifestar
até algum regozijo quando se noticia que caiu o número de homicídios em Feira,
embora sabendo que a polícia faz, apenas, o que pode, com os parcos meios de
que dispõe, e que homicídios, a mais ou a menos, dependem apenas da vontade ou
da necessidade de bandidos que atualmente mandam em certas partes da cidade e
dominam determinados negócios.
O trânsito é outra questão que a cada dia faz aumentar as
angústias da população e do governo, característica dos tempos que estamos
vivendo de enormes contradições, encantos e desencantos. Automóvel sempre foi o
sonho dourado de grande parte da população. E por vários motivos. O dono de
carro subia socialmente e gozava de facilidades amplamente proclamadas, entre
as quais a da liberdade de movimentos. Até época relativamente recente,
entretanto, veículo próprio era apanágio de poucos. Basta dizer que até os anos
setenta andava-se tranquilamente nas ruas. Carros eram raros. Ainda há quem se
lembre dos “carros de praça”, uns seis ou sete, que faziam lotação para
Salvador nos tempos do após guerra (1939/45), em viagem de três a quatro horas
quando tudo corria bem. Seus proprietários, alguns deles, gozavam de grande
prestígio e notoriedade, como Pedro, ex-motorista de Carlito Bahia e genro de
Afonso do Vinagre, Euzébio, que transportava, sozinho, malotes de dinheiro de agências
bancárias entre a Capital do Estado e esta cidade (nunca foi roubado), Luiz
Ferreira e Oldack, que dirigia velho Chevrolet, sempre à disposição de todos os
farristas, desde os tempos das noturnas e mais ou menos secretas reuniões dos
comedores de moquecas de cágado em casa da Rua Marechal Deodoro. Carros particulares
contavam-se pelos dedos. Alguns ficaram famosos como o Cadilac, de Florisvaldo
Albuquerque, caixa do Banco da Bahia, o Citroën do médico e vereador Osvaldo
Pirajá, o Ford, modelo 1930, de José Martins (Zé do Rato) e outro velho Ford, o
de Eloi do Nascimento, escrivão do Forum de Santo Estevão.
A partir dos anos sessenta Feira disparou. Suas terras se
valorizaram. A cidade cresceu. As chácaras desapareceram, transformadas em ruas
e casas principalmente com a chegada de nordestinos, grande parte deles pessoas
empreendedoras, que trouxeram o progresso e novas ideias. Foi o tempo do
caminhão, que passou a ligar o país de norte a sul. Ser dono e motorista de
caminhão eram motivos de desejo e anseio de futuro de muitos jovens atraídos
por vida de aventuras e lucros. Com a cabine dupla, a certa altura, os
motoristas introduziram, nos veículos, conjuntos de buzinas que tocaram o
“Joazeiro, Joazeiro” de Luiz Gonzaga, que fizeram sucesso até recentemente, no
interior da Bahia, de onde a rapaziada sumiu em busca de melhores dias, em
outras plagas, deixando extremamente
ansiosa e carente a população feminina.
Recentemente apareceu
em Salvador, para dar palestra, o urbanista, ex-prefeito da capital da Colômbia
e pré-candidato a presidente daquele país, Enrique Peñalosa, a afirmar, em
entrevista, que as cidades, para sobreviver, têm que se livrar dos carros, e que a salvação está no transporte coletivo.
Disse o que todo mundo sabe: sem transporte não há crescimento. Mas, o carro,
transformou-se em inimigo do progresso. O mundo é assim. Há pouco tempo comer
bem significava garantia de saúde. Agora, mata o sujeito rapidamente.
Hugo Navarro da
Silva - Santanopolitano, foi aluno e professor do Colégio Santanópolis.
Advogado, jornalista escreve para o "Jornal Folha do Norte".
Gentilmente, a nosso pedido, envia semanalmente a matéria produzida
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