Colonização criou geração de deserdados
Vinte e quatro anos depois de iniciado pelo regime militar (1964-1985), o projeto de colonização da Amazônia não conseguiu fixar na terra o grosso dos agricultores trazidos de todo o país e formou uma geração de deserdados.
Pelos dados do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), menos de 20% dos pioneiros continuam nos projetos agrícolas feitos na década de 70. Cerca de 200 mil famílias foram para a Amazônia nos anos 70 e 80.
A maioria dos assentados abandonou os projetos ou morreu durante o desbravamento, vitimados pela malária, picadas de cobras ou por acidentes nas propriedades.
A reportagem da Agência Folha percorreu mais de 700 km de Porto Velho até o sul do Estado, encontrando o caminho tomado por propriedades rurais abandonadas pelos antigos colonos. A atividade econômica predominante é a pecuária.
Os projetos agrícolas foram iniciados após uma maciça campanha publicitária promovida pelo governo do presidente Emílio Garrastazu Médici (1969-1974).
O objetivo do regime militar era o de ocupar o território amazônico -garantindo as fronteiras do país em uma região rica em recursos naturais, principalmente minérios-, dando a centenas de milhares de lavradores terras que não havia em outras regiões. A maioria dos assentados saiu da região Sul.
Rondônia foi o Estado da Amazônia que mais recebeu colonizadores. O Incra realizou 100 mil assentamentos na área, envolvendo 500 mil pessoas.
``Hoje, as propriedades rurais já estão nas mãos do terceiro dono. Os pioneiros foram embora. Pelo menos 80% abandonaram as terras", disse Adhemar da Costa Salles, técnico do Incra que chegou a Rondônia em 1971.
Salles afirmou que o fracasso dos pioneiros deveu-se à falta de assistência adequada do governo federal aos assentados.
Segundo ele, os colonos eram deixados na floresta e obrigados a viver com a família em barracas de lona, completamente isolados.
Ex-secretário-adjunto de Agricultura do Estado, Salles disse que a disseminação da malária, a falta de estradas para escoar a produção e a baixa produtividade das terras selaram a sorte dos assentamentos.
Salles disse que não há contabilização do número de mortes ocorridas nos projetos durante as décadas de 70 e 80.
O único dado disponível é o número pessoas que contraíram malária em Rondônia -febre infecciosa transmitida pela picada de um mosquito. Em dez anos (71/81), foram 55.430 colonos.
Maria Neusa Reis, que saiu de Curitiba em 1975 com a família para Rondônia, diz que os assentamentos foram um verdadeiro ``massacre". ``Eu me recordo que em apenas um mês 42 chefes de família morreram na floresta esmagados pelas árvores durante a derrubada da mata", afirmou.
``As viúvas se desfizeram das propriedades e retornaram a seus Estados. Quem ficou, teve de sobreviver de outra coisa", contou Maria Neusa. Ela não quis terras para plantar. Dedicou-se ao comércio. Hoje, é dona de um hotel.
A comerciante mora em Colorado d'Oeste, município com 50 mil habitantes no sul do Estado. A cidade surgiu de um dos primeiros projetos de colonização e fica próxima de Corumbiara, que, na semana passada, foi palco de conflito entre PMs e trabalhadores.
LUIZ MALAVOLTA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RONDÔNIA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RONDÔNIA
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