Hugo Navarro da Silva |
“Justiça do Camisão que tome conta” já foi terrível praga no
sertão da Bahia, não sabemos o motivo exato, se a Justiça do atual município de Ipirá era
implacável com os transgressores da lei, ou se as questões ali nunca encontravam solução, atormentando as
partes pelo resto da vida, mas o vaticínio era temido, assustando mais do que “praga
de urubu”, que por algum metafórico artifício
da linguagem sertaneja camuflava outra expressão, a temida “praga de
padre”, considerada mais perigosa do que “praga de mãe”, capaz de grandes
estragos.
A praga, rogo às divindades para impor desgraças ao próximo,
por qualquer motivo sério, pedido de punição que a religiosidade introduziu nos
hábitos do povo, é coisa que vem da antiguidade. A pior, a mais eficaz, era a
que se rogava na missa, no momento da elevação
da hóstia ou em certas horas mortas.
Praga, explica o Bluteau, deriva de palavra grega que tem o
sentido de chaga, desgraça que se deseja “a pessoas, reinos e monarquias”. Os
romanos a conheceram e lhe davam enorme importância ao invocar, contra os
inimigos, a ira dos deuses.
Pragas estão na Bíblia, no Êxodo, o que leva a crer no seu
uso pelos antigos hebreus. Moisés, irritado com o faraó e querendo a libertação
dos hebreus, lançou tremendas pragas contra o Egito, todas decretadas por
Iahweh, a começar pela praga dos gafanhotos, que talou as plantações, não
poupou sequer a grama, e terminou com a morte de todos os primogênitos. Os
hebreus, libertados e eufóricos, despojaram os egípcios de todos os bens de
valor, ouro, prata e gado, em episódio que a Bíblia chama de espoliação, mas
demonstra que o roubo pode ter inspiração divina.
No mundo moderno a praga associou-se ao baixo espiritismo
como ferramenta de adivinhos, parte da magia, e ampliou seu elenco de
malefícios, chegando aos enguiços, que atrapalham a vida da pessoa, bloqueando
qualquer possibilidade de progresso; aos quebrantos, que provocam desânimo e acabam
com o sujeito e às infestações, em que forças espirituais negativas, os
“espíritos de porco”, tomam conta da vítima, pode ser pessoa, lar ou
comércio, que infestados de maus
espíritos marcham rapidamente para a ruina
que conseguem evitar com algumas
manobras e despesas, nem sempre pequenas, em que se incluem rezas, velas e
outras exigências rituais. Nestes casos, entretanto, a praga migra para o
terreno da feitiçaria e da adivinhação de que, aliás, muita gente vive, às
vezes aparecendo no noticiário policial
com golpes capazes de fazer inveja aos mestres do vigarismo nacional e
estrangeiro.
A praga tornou-se, no decorrer dos tempos e das mudanças,
costume arraigado no seio da sociedade. Vai sofrendo transformações mas conserva linhas originais, sempre motivada pelo desejo de vingança e de
represália, variando de forma, apenas, conforme o grau de aprovação moral do grupo social em
que se manifesta. Pode, entretanto,
assumir feição de crítica ou reprovação quando o povo não encontra meios de se
manifestar livremente.
Ora, o governo, em seu vasto esquema de tapeações, de que
sobrevive, criou programa para dar mais
médicos ao país, em cujo miolo está a importação de três mil esculápios
cubanos, muitos dos quais já se encontram em atividade, receitando Dipirona,
demonstração de que ou a ilha do Cuba tem fábrica de médicos e é necessários
exportá-los, ninguém sabe com que missão, salvo a específica, de exercer a
Medicina, ou se o governo brasileiro tem acordos sinistros e secretos com os
irmãos Castro, que julga imperioso cumprir.
De uma forma ou de outra, com Dipirona ou sem ela, com
festivas homenagens encomendadas ou com a reprovação e as desconfianças gerais,
o povo criou nova praga que já anda circulando nas ruas: “Médico cubano que te
cure!”
Afirma-se que da nova praga ninguém escapa vivo.
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