-Uma deliciosa crônica de João Batista sobre a paixão pelo futebol…
Era apenas mais um café da manhã antes de começar a reunião do Conselho de Administração da Unicred Central Multirregional, em Belo Horizonte, janeiro ou fevereiro de 2020. Ao adentrar ao restaurante do hotel no qual estava hospedado, dentre a dezena de amigos da UCM, que demandavam de cidades dos estados da Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo, apenas Arnoldo de Souza: cardiologista, escritor, professor na cidade de Governador Valadares, e membro do Conselho Fiscal da Central de Crédito Cooperativo.
– Bom dia, Arnoldo. Tudo bem com você e a família?
– Bom dia, João Batista. Tudo bem, por favor, sente aqui à mesa para tomarmos o café juntos e conversarmos um pouco.
Culto, prolixo, cooperativista de mão cheia, Arnoldo, quando falava, surpreendia os ouvintes. Um amigo em comum e de longa data, militante nos movimentos Unimed e Unicred, Carlos Antônio Alves Fahar, obstetra em Uberaba, costumava dizer que Arnoldo falava como Senador, em alusão à capacidade desses nobres legisladores de fazer um longo discurso a partir de um pequeno e insignificante fato.
Naquela manhã belo-horizontina, friorenta e chuvosa, já sentado à mesa e iniciando a sorver uma generosa xícara com o bom café mineiro, bebida apropriada para aquecer o corpo, para não fugir ao seu estilo de surpreender, Arnoldo me perguntou:
– João Batista, como anda o Fluminense de Feira?
Fique sabendo que eu torço para o tricolor da sua terra, campeão baiano de
futebol nos anos de 1963 e 1969 e que não pode continuar na segunda divisão do
futebol da Bahia.
Confesso, diante da surpreendente declaração, que quase
engasguei apenas com um pequeno gole de café. Encontrar em Belo Horizonte um
mineiro, de Governador Valadares, claro que é um fato corriqueiro. Entretanto,
que esse mineiro torça pelo Fluminense de Feira, clube de passado glorioso,
entretanto de um presente preocupante, era inusitado.
Refeito do susto e alegre por encontrar um torcedor
do clube do meu coração, não tão sofrido quanto o meu, que há décadas está na
torcida pelo sucesso do Fluminense de Feira e embora calejado de sofrer ainda
persista, passei a ofensiva.
– Arnoldo, disse-lhe, tenho orgulho de ter
assistido a inúmeras partidas do Fluminense de Feira, que já teve em seus
quadros um verdadeiro escrete: Evaristo de Macedo, técnico; Renato ou Ubirajara
no gol; Ubaldo, Sapatão, Mário Braga ou Paulo Ricardo, Nico ou Maroel na
defesa; um meio-campo formado por Merrinho e Delorme Martins ou Maranhão; e um
mortal ataque constituído por Jurinha, João Daniel, Freitas e Robertinho.
– E você, assistiu o Fluminense de Feira jogar em
que estádio de futebol?
A resposta foi rápida e não deixou dúvidas quanto
ao universo mental de Arnoldo.
– Não, João Batista, disse-me Arnoldo, nunca pude ver uma partida do Fluminense de Feira. Torço pelo seu time apenas por tabela, pois da infância ao período que fazia curso de especialização e morava na capital carioca, tornei-me um torcedor apaixonado pelo Fluminense do Rio de Janeiro, meu pó de arroz.
Terminamos o café conversando sobre amenidades e nos despedimos. Foi a ultima vez que nos encontramos.
Em 3 de abril de 2021, acometido pela
Covid-19, internado em um bom hospital e dispondo das terapias recomendadas à
época, Arnoldo não resistiu.
Em campo, sua história foi homenageada pelos
atletas do Tricolor das Laranjeiras, que na partida de 6 de abril, realizada no
Estádio da cidade de Volta Redonda, fizeram um minuto de silêncio em memória ao
fanático e dileto torcedor. Talvez, por interferência de Celso Corrêa de
Barros, pediatra no Rio de Janeiro e amigo em comum dos tempos de militância no
Sistema Unimed.
Desde então, não esqueço nem do fato e nem daqueles
breves momentos de um encontrou casual, que sempre me trazem uma boa dose de
emoção e saudade.
Vida que segue!
Que Deus o tenha em sua Gloria, amigo Arnoldo.
Transcrito da Academia Feirense de Letras
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