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FOTO OFICIAL DO ENCONTRO

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quinta-feira, 17 de março de 2022

POLÍTICA DE ANTÃO - VI

MARCOS PÉRSICO – Santanopolitano, cineasta, teatrólogo, escritor.
 

POLÍTICA DE ANTÃO - V

DA ELEIÇÃO ATÉ A POSSE

[...] Não será novidade alguma se eu disser que depois da eleição vieram os conchavos e os acertos dos cargos e empregos. Os pagamentos das promessas de campanha sempre têm um alto preço, mas quem sempre paga a conta é o otário do povo mesmo [...]


TERMINADO OS FESTEJOS DA vitória, e passados alguns dias, o delegado começa a armar seu gabinete. A nova administração do município ficou assim composta:

    Poder Executivo:

    Gilberto Moreira Cavalcante - Prefeito - PSD

    Poder Legislativo:

    Tonho da Cachorra - Reeleito - PSD

    Carlito Bacalhau - Reeleito - PSD

    Xéxeu de Tonha - Eleito - UDN 

    Paulo Corujebó - Eleito - UDN 

    Zeca Zoró - Eleito - PSD 

    Tonho Capenga - Reeleito - PSD 

    Anacleto Capanico - Eleito - UDN 

    Elias Roncolho - Reeleito - UDN 

    Boca de Sulapa - Reeleito - PSD

    O prefeito eleito tinha maioria na câmara de vereadores. Cinco edis do PSD e quatro da UDN. Assim, era necessário ter muito cuidado para não perder um vereador, senão ficaria com a minoria no legislativo. Como Nossa Senhora das Dores era uma cidade pequena e aparentemente fácil de governar, o prefeito eleito não estava muito preocupado. No final de novembro, foi até Recife ter uma audiência com o Secretário de Segurança Pública, para consultar quem seria o novo delegado da cidade e pedir melhoria do efetivo policial bem como reparos na delegacia da cidade, pois havia apenas uma cela e as instalações do prédio estavam necessitando de uma reforma. Voltou da capital sem saber quem seria o novo delegado e sem garantias de que suas reinvindicações seriam aceitas.

Passada a euforia política, padre José volta à cena da paróquia. Comedido e cauteloso, evitava sempre falar em política.

Numa manhã de sexta-feira, foi procurado logo cedo pelo prefeito eleito.

-       Ora, ora... Prefeito, o que o traz aqui tão cedo nesta humilde casa paroquial?

Abriu a porta e fez as honras da casa.

Prefeito Gilberto entrou, tirou o chapéu e sentou-se no velho sofá. Pigarreou, procurou um lugar para cuspir, foi até a janela e cuspiu no passeio.

-       Padre José, o que me trás aqui é a solenidade de posse. Eli gostaria de combinar com o senhor para fazermos uma festa linda. Quero que o senhor celebre uma missa na praça. Vou mandar construir um altar para essa celebração.

O padre riu, olhou fixamente nos olhos do prefeito Gilberto e falou pausadamente.

-       Como o senhor sabe, não posso celebrar nenhum santo ofício fora do templo da nossa madre Igreja.

-       Mas padre, trata-se da minha posse como prefeito da cidade...

-       Eu tenho ordens a cumprir, senhor prefeito. Fiz meus votos de obediência e tenho que segui-los à risca.

-       Isso está me parecendo má vontade da sua parte, padre José

-       Não leve para este lado, senhor prefeito, eu não vou celebrar nem para o senhor e nem pra ninguém. Se o senhor quer uma missa de ação de graças pela sua eleição, que esta missa seja aqui na minha paróquia, caso contrário, o senhor vai ficar sem missa.

-       Está certo padre José, que seja na sua igreja, mas que seja uma missa bem bonita e com alto-falantes pelo o lado de fora, pra que o povo que me elegeu participe dessa cerimónia.

-       Assim está melhor, prefeito, vamos fazer uma celebração bonita para o povo.

-       Já que estamos combinados, qualquer coisa que o senhor precisar até o dia da missa, pode me procurar. Vou mandar minha mulher, Catuta e minha filha, Maria Flor, ajudarem o senhor no que se fizer necessário.

-       Está bem, prefeito, vou precisar mesmo de ajuda.

-       Até mais, padre.

Senhor Gilberto saiu apressado e foi se encontrar com os correligionários, a fim tratarem de assuntos ligados aos gabinetes da prefeitura.

Na passagem pela praça, o prefeito deu de cara com alguns jovens conversando perto do bar do Seu Zeca.

A modernidade já havia chegado por lá, e alguns estavam ouvindo rock num rádio de pilha no último volume, mascando chicletes. Estavam vestido de calça de brim, tipo rancheira, camisa xadrez, os cabelos penteados com brilhantina Glostora, todos com topetes das mais variadas formas. Eram uns tipos estranhos à cultura da região, mas era época de modernização. Tinha um jovem excêntrico sentado no selim de uma lambreta de cor amarela. O prefeito Gilberto parou, olhou bem a lambreta, bateu nos ombros do jovem e disse:

-       Ótimo meu rapaz, você acaba de me dar uma ideia fabulosa. Vou equipar minha prefeitura com alguns veículos desses. Quero que nossa cidade bem visitada por todos os funcionários. Parabéns meu rapaz... Parabéns.

O jovem sem entender nada se limitou a rir.

No rádio tocava uma balada romântica cantada por Pat Boone e    o prefeito se distanciou prestando atenção na música.

Na verdade, o que havia era uma mudança de comportamento da juventude. Nascia a geração Coca-Cola, os chicletes, a forte  influência da cultura norte-americana. O milk-shake, o hot-dog, o ketchup, o sundae eram hábitos que aos poucos estavam sendo incorporados aos costumes de todos os brasileiros.  A televisão já exercia fascínio nos jovens. Elvis Presley, Paul Anka, Beatles já começavam a fazer sucesso entre nós, e tudo o que era cultivado pelos jovens no eixo Rio - São Paulo, embora demorasse um pouco, também chegava para a juventude do Nordeste do Brasil. Aos poucos, essa nova geração vai ocupando espaço com uma nova forma de vida.

Mas não era só o americanismo que fazia a cabeça da juventude. Como havia a guerra fria, capitalismo e comunismo lutavam por seus espaços num mundo que nem sonhava com globalização.

A corrida armamentista entre EUA e União Soviética estava fazendo com que houvesse divisões ideológicas.

Embora fossem minoria, os jovens que se dedicavam à leitura, eram jovens não alienados. Faziam parte de uma minoria pensante que seria capaz de modificar a estrutura social e cultural. Assim, alguns poucos desses jovens, em Nossa Senhora das Dores, se dedicavam às reuniões no Centro Paroquial para debater junto com o padre José, idéias socialistas que se aplicavam ao bem-estar das comunidades.

Esse grupo ganhou a simpatia do novo prefeito e mesmo antes da posse, ele já havia participado de uma reunião com essas lideranças para tratarem de assuntos sociais e políticos.

Padre José, aos poucos foi simpatizando com o prefeito eleito e pactuando com suas idéias de construir uma sociedade mais justa, com menos desigualdades sociais. Implantou uma Comunidade Eclesial de Base, (CEB), para fazer um levantamento da sociedade rural, pactuando com o projeto de reforma agrária do então presidente João Goulart. Aos poucos, foram costurados acordos e tudo estava indicando que a administração do prefeito Gilberto seria um sucesso.

Em primeiro de Janeiro de 1963, o então prefeito eleito toma posse numa festa linda, onde toda a comunidade se fez presente ao ato religioso e cívico. O prefeito que estava deixando o cargo fez um discurso emocionado e passou a faixa com o brasão do Município ao novo prefeito.

Era o início de uma nova era na história da cidade. 

 


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