Hugo Navarro Silva |
O Brasil, em quinze dias, tem sofrido surpresas e
transformações que dificilmente poderiam ser imaginadas em cento e cinquenta
anos de evolução. O governo dormia tranquilo, aboletado no alto das pesquisas
que lhe davam mais de oitenta por cento de aceitação popular. O prestígio da
presidente, avassalador, afastava qualquer possibilidade de oposição séria e
consistente. Nem Adolf Hitler, quando anunciou o seu Reich de mil anos, sentiu-se
mais seguro e mais eufórico em seu “reinado”, do que a primeira mandatária da
nação brasileira.
Afinal de contas havia as pesquisas de opinião,
surpreendentemente favoráveis, poderosos meios de comunicação de massa faziam
ostensiva propaganda dos “grandes” feitos governamentais, o ambiente na América
Latina, com os plebiscitos e reformas constitucionais esticadoras de mandatos
presidenciais, embora com a miséria e o sacrifício dos interesses da população
assolavam a América do Sul, tudo em nome da democracia, verdadeiros refrigérios
para governantes e respectivos acólitos, sabidórios e bobos das cortes
imperiais que se instalaram nesta parte do mundo. Tudo corria às mil
maravilhas.
O povo brasileiro, pensavam os governantes, tinha tudo para
estar completamente embevecido com as “conquistas” governamentais e o rumo que
as coisas tomavam. Tínhamos salário mínimo como nunca houve. Pobres compravam
automóveis como se fossem bananas de quitandas, as bolsas disso e daquilo
garantiam votos necessários à manutenção do domínio imperial. Para coroar toda
a ostentação de força e de realizações de que este país vem sendo palco,
conseguimos atrair três das mais importantes disputas esportivas do mundo, para
o que tivemos que construir, às pressas, estádios a que deram o nome de arenas, no modelo europeu,
caríssimos, sofisticados, luxuosos, superfaturados, a contrastar com as origens
do nosso futebol, eminentemente populares. As tais arenas, na sua maioria de grande imponência e beleza, estão nas mãos
de empresários cujo interesse de lucro oferece enorme contraste com a situação
dos grandes clubes nacionais, todos, quase, a lutar contra dificuldades
financeiras, criando enorme distanciamento entre o esporte preferido do povo e a real situação dos brasileiros com o banimento das “gerais”
e suas naturais e espontâneas
manifestações de alegria. Os novos estádios podem ser transformados em
colossais elefantes negros, coliseus a cair aos pedaços a mostrar, para a
História, o triste período de domínio do César brasileiro.
A crise dos serviços públicos essenciais tirou do berço
esplêndido a presidente, seus trinta e nove ministros e seus vinte e dois mil
auxiliares demissíveis e o povo foi para as ruas. Em duas falas a presidente
nada disse capaz de resolver qualquer coisa. Uma parte da lengalenga,
entretanto, não deixou de assustar: a que tratava de plebiscito para mudar a
Constituição, que lembrou a Venezuela de Chaves, a Bolívia do Morales e o
Equador do Corrêa, exemplos do que não se deve fazer e está despertando
pronunciamentos e opiniões divergentes. Mesmo se afastada a possibilidade do
Brasil ingressar no Grupo Bolivariano, resta a suspeita de que a presidente
quer ganhar tempo, enrolar, ou dirigir a crise, que é contra o governo e sua
gestão, para questões de ordem política.
O bicho, entretanto, está solto e a Bastilha já caiu. Não há
mais como conter as iras populares. A oposição, que faltava aos políticos,
apareceu no seio do povo. Não podemos esquecer o espetáculo dado na Câmara
Federal na noite de terça-feira última, quando a velha quadrilha do governo
mudou de opinião na derrubada da PEC-37,
em cuja aprovação até a OAB, que não pode ver defunto que não chore, andou
ferrenhamente empenhada. Os assuntos urgentes, não mudanças políticas, devem
ser tratados em primeiro lugar.
Ninguém duvide: o barril de pólvora está pronto e o pavio já
foi aceso. Acabou a farsa.
Hugo Navarro da
Silva - Santanopolitano, foi aluno e professor do Colégio Santanópolis.
Advogado, jornalista escreve para o "Jornal Folha do Norte".
Gentilmente, a nosso pedido, envia semanalmente a matéria produzida
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