Apresntação dos grupos amadores . Fonte: acervo particular do pesquisador, santanopolitano Carlos Mello |
Henrique pegou o baú e o
abriu, olhando o que tinha dentro dele: várias fotos de alguns grupos teatrais
de Feira de Santana, recortes de jornais, um caderno de poesias, panfletos
antigos e até ingressos de espetáculo de Circo. O menino estava fascinado,
envolvido por um monte de informações sobre sua cidade que nunca lera em livro
algum, nem ao menos na escola; nenhuma informação como aquela havia sido dita.
Imerso que estava, não se apercebeu que sua avó havia lhe flagrado
Henrique, o que você está
como fazendo aqui? Tenha cuidado da com o meu baú, pois ele é muito, importante
para mim.
Henrique, assustado,
respondeu: - Desculpa, vó Antónia. O vô Arlindo falou do seu baú, e aí fiquei
curioso para conhecer essas histórias, principalmente as do Taborda, pois ele
disse que conheceu a senhora com a apresentação desse grupo.
Sua vó desfez o semblante
de repreensão, deu-lhe um sorriso e falou.
- Foi sim no ano de 1937.
Eu estava com minha Tia Izabel e minha prima Sofia, tínhamos ido assistir uma
apresentação do Taborda específica sobre as comemorações ao o Dois Julho na
cidade! Eu era muito jovem, ainda meio menina, e seu avô também.
Antônia pegou todo o
material do baú, sentou-se numa poltrona antiga e disse:
Venha cá que vou lhe
contar algumas histórias do Grupo Taborda e do Grupo Salles Barbosa. De acordo
com meu Pai Cristóvão e com seu bisavô, o grupo um dos
grupos teatrais que mais tempo atuou na cidade, desenvolvendo atividades de
1906* até 1934. Meu pai me contava que o fundador foi Sr. Ulisses Silva, que
depois se tornou sócio dos senhores Domingos Araújo, Ismael Barbosa e Tude Oliveira.
Olha Henrique, esse recorte de jornal foi seu bisavô que me deu; ele também
gostava de teatro e era muito fá do Taborda. Neste recorte, podemos encontrar
alguns dos integrantes desse grupo, como Arnold Silva, Avelino Martins,
Salustiano Farias Júnior, Gilberto Costa, Manoel Costa Ferreira, Martiniano
Carneiro, Isabel Costa, Alberto Alves Boaventura, Dálvaro Silva e João Martins,
além de Miguel Araújo, que exercia a função de diretor. Henrique esse Sr.
Manoel C. Ferreira, citado neste recorte, é o Sr. Maneca! Que foi coletor
estadual e um dos fundadores da Micareta de Feira.
-
Henrique interrompeu:
—
Vó, então é por isso que o circuito da micareta tem esse nome; e em homenagem a
esse Maneca!
Antónia
sorriu e retomou a fala:
-
Isto mesmo meu neto. Mas me deixa voltar para onde paramos. O Taborda
ressaltava valores da família, da moral e prezava por questões da civilidade; considerado
por Dr. Eurico Alves, grande poeta da cidade como uma das relíquias da cultura
feirense. Nestes recortes de jornais colecionados pelo meu pai, e passados para
mim, constam registros sobre as seguintes peças: o drama Esposa e Mãe (1932),
de J. Vieira; Gilberto, o Marinheiro (19330; A COMÉDIA Nhô Munduruca (1932); o
drama Helena (1934); e o drama. As provas dos crimes (1936),
Antônia contava a
história através dos documentos que estavam no baú antigo, e Henrique segurava
cada recorte de jornal como se fosse um tesouro. Foi quando o menino se deparou
com uma nota de jornal intitulada “Tangões e Gabiarra”; esta fazia uma crítica
à apresentação do grupo Salles Barbosa, Henrique entendeu o recorte e falou:
-Olha, vó, aqui nesse
jornal está falando de outro grupo. Quer dizer que havia vários grupos teatrais
na cidade?
Antônia, contente com a
curiosidade do neto, começou a falar:
— Minha Tia Izabel, que
era professora na Escola Normal, certa vez me contou que existiam alguns grupos
de teatro amadores na cidade, tais como: Grêmio Dramático Familiar (1892 a 1900);
União Caixeiral 1900; Taborda - 1906 a 1934; Artur Azevedo - 1912; e Grêmio
Dramático Salles Barbosa (entre as décadas de 1920 e 1930). Este último tinha
na sua formação o Sr. Elziário Santana (um dos arrendatários do Cine-Teatro
Santana na década de 1930), Osvaldo Santos, Antônio Ribeiro Mascarenhas,
Florisberto Moreira da Silva, Rute Fernandes, Olga Soledade, Euclides
Mascarenhas, dentre outros. Assim como o Taborda, o grupo Salles Barbosa
realizava seus ensaios no Cine Teatro Santana. Entre estes dois grupos
dramáticos existia um clima de rivalidade, o que os levava ao aprimoramento,
para que um não fizesse uma apresentação inferior à do outro. 0 Taborda, por
ter certa tradição na cidade, geralmente recebia críticas elogiosas e uma boa
divulgação das suas apresentações; isso ocorria também, devido ao fato de
alguns de seus componentes estarem ligados ao ramo jornalístico, como o Sr.
Martiniano Carneiro, dono do jornal Folha da Feira, e de outros, que mantinham
boas relações com o Folha do Norte. Nas apresentações realizadas pelo Taborda e
pelo grupo Salles Barbosa, geralmente, eram escolhidos um drama e uma comédia
para apresentação, sendo o drama uma peça com muitos atos, e a comédia com um e
dois atos. Quando não havia espaço para duas apresentações, a opção era pelo
drama, pois, para estes grupos, o drama era o gênero central da dramaturgia, já
que cumpre a função "educadora" do teatro. De certo modo, estes
grupos propagavam a imagem da cidade enquanto "Princesa", "dos
bons costumes", "da moralidade", "do progresso e da
civilidade".
Observando que sua avó
concluíra a história, Henrique, empolgado com uma ideia que lhe surgiu na
cabeça, falou:
— Vó, eu tive uma ideia
bem legal: vou falar com meu professor de Teatro, Fernando, para marcarmos um
dia no qual a senhora poderá contar todas essas histórias para a minha turma.
Daí, levaríamos esse baú e mostraríamos os recortes para eles. 0 que a senhora
acha?
Antônia, tomada mais uma
vez pela empolgação do neto, concordou. Este, imediatamente, pegou o celular:
Foto divulgada no Folha do Norte, em 08 de junho de 1912 e repesenta uma homenagem a primeira formação do Grupo Taborda |
— Agora mesmo vou
perguntar no WhatsApp se ele concorda com essa ideia.
A avó, com uma expressão
confusa, questionou:
— Vai perguntar aonde?
Quem é esse tal de WhatsApp?
Henrique soltou um
gargalhada e disse:
- Não, vó, é uma pessoa,
é uma forma da gente se comunicar. Olha aqui, o professor já respondeu e marcou
para aula da semana que vem.
Antônia emocionada, pegou
o velho baú com suas memórias, passando-o para mãos de Henrique. Com um beijo
carinhoso no rosto, ela disse:
- Acho que está na hora de
você cuidar desse tesouro.
*Sobre a data do início do Grupo: ver Registro Históricos
*Sobre a data do início do Grupo: ver Registro Históricos
Aline Aguiar Cerqueira dos Santos
Publicado na Revista "Caminhos da Princesa".
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