Antonio Edson Santanopolitano |
O artigo que se segue tem mais de 40 anos. Foi escrito no
extinto Jornal da Bahia (Brasil), em 1979. Mas parece que foi redigido hoje. O
autor é José Alberto Gueiros
Quando Winston Churchill, ainda jovem, acabou de pronunciar o
seu discurso de estreia na Câmara dos Comuns, foi perguntar a um velho
parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha achado do seu primeiro desempenho
naquela assembleia de vedetas políticas. O velho pôs a mão no ombro de
Churchill e disse, em tom paternal: "Meu jovem, você cometeu um grande
erro. Foi muito brilhante neste seu primeiro discurso na Casa. Isso é
imperdoável. Devia ter começado um pouco mais na sombra. Devia ter gaguejado um
pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje, deve ter conquistado, no mínimo,
uns trinta inimigos. O talento assusta."
Churchill |
E ali estava uma das melhores lições de abismo que um velho
sábio pode dar ao pupilo que se inicia numa carreira difícil. A maior parte das
pessoas encasteladas em posições políticas são medíocres e tem um indisfarçável
medo da inteligência. Isso na Inglaterra. Imaginem aqui noutros países. Não é
demais lembrar a famosa trova de Ruy Barbosa:
"Há tantos burros mandando em homens de inteligência,
que às vezes fico pensando que a burrice é uma Ciência."
Temos de admitir que, de um modo geral, os medíocres são mais
obstinados na conquista de posições. Sabem ocupar os espaços vazios deixados
pelos talentosos displicentes que não revelam o apetite do poder. Mas é preciso
considerar que esses medíocres ladinos, oportunistas e ambiciosos, têm o hábito
de salvaguardar suas posições conquistadas com verdadeiras muralhas de granito
por onde talentosos não conseguem passar. Em todas as áreas encontramos dessas
fortalezas estabelecidas, as panelinhas do arrivismo, inexpugnáveis às legiões
dos lúcidos.
Dentro desse raciocínio, que poderia ser uma extensão do
Elogio da Loucura de Erasmo de Roterdam, somos forçados a admitir que uma
pessoa precisa fingir de burra se quiser vencer na vida. É pecado fazer sombra
a alguém até numa conversa social. Assim como um grupo de senhoras burguesas
bem casadas boicota automaticamente a entrada de uma jovem mulher bonita no seu
círculo de convivência, por medo de perder seus maridos, também os encastelados
medíocres se fecham como ostras à simples aparição de um talentoso jovem que os
possa ameaçar. Eles conhecem bem suas limitações, sabem como lhes custa
desempenhar tarefas que os mais dotados realizam com uma perna nas costas,
enfim, na medida em que admiram a facilidade com que os mais lúcidos resolvem
problemas, os medíocres os repudiam para se defender. É um paradoxo
angustiante.
Infelizmente temos de viver segundo essas regras absurdas que
transformam a inteligência numa espécie de desvantagem perante a vida. Como é
sábio o velho conselho de Nelson Rodrigues: "Finge-te de idiota e terás o
céu e a terra”.
O problema é que os inteligentes não gostam de brilhar. Que
Deus os proteja para que as cobras não os ataquem.
Confirmando esse texto tão realista quanto à controversa
natureza humana e o seu reflexo na sociedade, sugiro a leitura do conto de
Machado de Assis, "Teoria do Medalhão", originalmente publicado na
"Gazeta de Notícias", no ano de 1881, mais tarde integrado ao livro
"Papéis Avulsos".
Em um discurso
polêmico, apresenta conselhos inescrupulosos de um pai para o filho visando que
possa alcançar prestígio em uma sociedade de aparências.
Sobre bases de
ironia, a obra aponta para a valorização do "parecer ao invés de
ser", analisando o comportamento medíocre por meio do qual se pode
pleitear a ascenção social sem grandes esforços.
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