Lendo o jornal “A FLÔR”, coletânea histórica deste hebdomadário
do ano de 1921, organizado pelos
santanopolitanos Carlos A.A. Mello e Carlos A.O. Brito, patrocinado pela
Fundação Senhor dos Passos – Núcleo de Preservação da Memória Feirense Rollie E.
Poppino, me deparei com uma contenda de cinco colunistas no mesmo jornal.
Quando nós
lemos história, a primeira questão é tentar se enquadrar à época em que o
relato se deu. É interessante verificar o mais ou menos semanário, dado que o
espaço destinado a esta briga tomou dezenas de páginas, para um transbordamento
de egos com violência verbal de todos os participantes. Como a briga é longa,
dividi em capítulos.
A PEDIDO
DE COMO GUIOLARDO FAZ ARTIGOS
Há já pouco ano que o jovem e talentoso académico de
medicina-Guilardo Cohim, se vem apresentando como meteoro raro neste nosso
restrito âmbito intelectual, aonde muitíssimo recopilada é a pleiade dos que
cuidam da cultura literaria, logrando por esta circunstancia sairem ilesos de
critica os seus artigos, julga o rapaz que está produzindo custosas joias de
literatura.
Mais eu que tenho o defeito de obrar segundo as minhas ideas
naturalmente opostas as dos meus religionarios, eu que costumo dizer mal de
tudo quanto a mim não me parece bom, eu que penso ser a critica indispensável
ao desenvolvimento da arte e da ciência, não posso de modo nenhum esquivar-me
de proceder ligeira referencia acerca das suas excelentes produções, apezar de
que me eu julgo também suscetível a critica.
Foi no salão nobre do grémio litero-dramatico Rio Branco,
ora derrocado, que o jovem Guilardo Cohim proferiu estraordinaria conferencia
literaria, versando em tése sobre a legendária Grecia de Solon, de Xenofonte,
de Platão e de Temistocles, sugestionando o seleto auditorio com o vigor do seu
verbo eloquente de orador predestinado.
Falou-se, falou-se então de Guilardo como se fala de um sabio
portento. A gente do Rio Branco, mui pouco apercebida na matéria, vibrou de
entusiasmo, aplaudiu calorosamente o novel e já tão esclarecido letrado, que
discorreu com tão grande sabedoria e veracidade.
Mas eu parece-me que lia então o colosso historico de Cesar
Cantu e o Helenismo de Oliveira Martins, não podia jamais concordar com as
opiniões estravagantes de Guilardo. E se eu assim o não hovera feito, teria
antes que renegar os historiadores mais ilustres. Hoje té me rependo depois que
as não segui. Vejamos agora de como Guilardo falou das ciências, artes e tetras
dos antigos helénicos, de sob as teorias insensatas de historiadores mediocres.
Disse o jovem academico na sua eletrisante conferencia,
maculada de erros gramaticaes, foi Demostenes o mais celebre tribuno da era
antiga. Diante desta sua justa e sabia clasificação de moço versado em altos
conhecimentos de historia universal, fiquei desde logo percebendo a sua
debilidade intelectual e minguada cultura cientifica e literaria, para dizer
algo sobre a patria de Homero e de Aristoteles.
Sem duvida Guilardo é o primeiro historiador que não crê na
existência do eminente autor das «Catilinarias,» e o critico profundo para quem
o vulto ciclopico de Pericles, não passou de uma vaperosa sonbra de creança.
Honcken o grande historiador alemão, procedendo em erudição e
criterio a Cesar Cantu e Victor Coussin, resalta a superioridade de Pericles
sobre Demostenes. O adepto aplicado depois de um estudo minuncioso, procura
então equipara-los e tirar a ilação de qual dos dois é o verdadeiro principe da
arte oratoria. Diz o illustre latinista dr. Cesar Zama na sua obra intitulada “Os
Trez Grandes Oradores da Antiguidade,” que, logo após o autor das primorosas
«Cartas a Coerelia,» surge a figura respeitável de Pericles.
Demostenes foi íncontestavelmente um génio, e Pericles, sobre
ser tarmbem um genio, era um artista original e insuperavel.
Nem mesmo sobre Demostenes que é o seu Deus e o seu homem,
Guilardo Cohim não discerniu com exatidão e clareza.
Esqueceu-se Lisias o fecundo orador que preduziu mais de
trezentos discursos, como fez a Isocrates o famoso retor ateniense que defendeu
Friné, acusada no tribunal por pretender introduzir no paiz uma nova religião.
Esqueceu-se também de mencionar os debates poeticos entre Pindaro e Cerina,
esqueceu-se de Teocrito o bucolico, de Aspasia que fundou uma escola aonde ela
mesma insinava eloquência e retórica: e, mais tarde condenada pelo tribunal por
arrastar donzelas à sua casa para satisfazer a lubricidade de seu esposo
Pericles, foi brilhantemente defendida por este, que, para liberta-la, alçou-se
aos pinaculos da eloquencia e da retórica. Deixou aparte o velho Diogenes e o seu
disciplo Antistenes, procedendo igualmente para com Zeno que foi o predecessor
do Darwinismo, e Aristotelis que juntou a filosofia e a metafisica num só
corpo, e foi sucedido na Inglaterra por Spencer, o objetivista.
Foi assim que Guilardo Cohim falou sugestivamente da arrojada
e esclarecida Grécia.
Agora surge-me ele de novo, fazendo-se jornalista de pulso
forte, com façanhas de Rochefort, citando Palas a deusa da guerra e da
sabedoria, e Vargas Vila o trágico liberalista.
Devido porém ao limitado espaço deste jornalsinho, deixo de
lhe esclarecer minunciosamente aos senhores as duas faltas gramaticaes em que
Guilardo incorreu.
Diz ele no seu primeiro artigo: « ... Nós que cedo aprendemos
a admirar o passadode nossa terra...não podiamos deixar de chorar...
O segundo é no seu derradeiro artigo.
“O glorioso exercito nacional não desmentiria jamais as suas
tradições excelsas de grandeza aquelles cujo sangue regou os campos do
Paraguay...”
A sua conferencia é o que são os seus artigos; verdadeira xaropada
de farmacologo reles.
Aluizio de REZENDE
Notas do Blog: 1) os erros por acaso encontrados, são do português da época ou da
tipografia. Na sequencia da série, notaremos a briga de acusação de erros da língua.2) este texto é um Facsimile do jornal "A FLÔR" edção nº12 de 10 de julho de 1921. pag. 2, 3
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