Evandro J.S. Oliveira |
Carl Friedrich Philipp von Martius e Johann Baptist von Spix |
Carl Friedrich Philipp von Martius nasceu na cidade bávara de
Erlangen em 17 de abril de 1794. Filho de um farmacêutico, sua escolha
profissional fora totalmente influenciada pelo tipo de trabalho do pai, e por
isso posteriormente decidiu estudar medicina. Em 1814 finaliza o curso com a apresentação
de um trabalho de doutorado sobre um estudo de botânica. Nessa mesma época, já
era conhecido do cientista e zoólogo Johann Baptist von Spix, que possibilitou
a entrada de von Martius na Academia de Ciências da Baviera.
Após retornar de sua jornada ao Brasil se torna membro e
secretário vitalício da Academia e ocupa também o cargo de conservador do
Jardim Botânico de Munique. Além de professor de botânica na Universidade de
Munique, Carl von Martius participa de várias sociedades científicas dentre
elas do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Em 1854, o rei Maximiliano II da Baviera introduz o projeto
de um "palácio de vidro" no Jardim, causando grande revolta em von
Martius que abdica do cargo de conservador.
Carl Friedrich von Martius morreu em 1868 aos 74 anos em
Munique no dia 13 de dezembro deixando esposa e filhos. Foi sepultado no Alter
Südfriedhof (Munique).
Percurso da expedição de 1817 a 1820
Carl Friedrich Philipp von Martius chegou ao Brasil em 1817
fazendo parte da comitiva da arquiduquesa austríaca Leopoldina, que viajava
para o Brasil para casar-se com Dom Pedro I. Acompanhado do cientista Johann
Baptist von Spix (1781-1826), recebera da Academia de Ciências da Baviera o
encargo de pesquisar as províncias mais importantes do Brasil e formar coleções
botânicas, zoológicas e mineralógicas, apesar da posição de outros
naturalistas, que consideravam a viagem perigosa.
Auxiliados por nativos e tropeiros, partiram do Rio de
Janeiro em dezembro de 1817 rumo ao norte do país, passando por São Paulo,
Minas Gerais, Goiás e pela Bahia. Ao
chegarem em Salvador em novembro do ano seguinte, despacham o material
zoobotânico, até então coletado e iniciam nova etapa da jornada. Nos quatro
meses seguintes concluem a travessia dos inóspitos sertões de Pernambuco, Piauí
e Maranhão.
Após percorrerem milhares de quilômetros, sob chuvas
torrenciais, seca, sede, calor e doenças, passam alguns meses em São Luís
recuperando-se do grande desgaste psicológico e físico. O mês julho de 1819 foi
marcado pelo inicio da exploração da bacia do Amazonas que durou
aproximadamente 8 meses. Seguiram o rio
Amazonas até alcançarem a atual fronteira do Brasil com a Colômbia. Devido à
doença do cientista Johann von Spix, o retorno da expedição foi antecipado e em
1820 retornaram à Alemanha.
Conclusão da viagem ao Brasil
Seis anos depois da chegada à Alemanha, Spix morreu em 1826,
em consequência de uma doença tropical contraída durante a expedição no Brasil.
O livro Reise in Brasilien, composto por três volumes, foi
publicado entre os anos de 1823 e 1831. Ele contém desenhos, estampas e mapas
revelando informações interessantes do Brasil. Os desenhos feitos por Martius e
Spix não só retratam a fauna e a flora, mas também as paisagens, o cotidiano do
país e a viagem realizada pelos dois cientistas.
A Flora Brasiliensis foi a obra de maior importância feita
por Martius, tinha o objetivo de documentar e sistematizar todas as espécies de
plantas brasileiras estudadas e também sua utilização medicinal, comercial e
econômica. Carl von Martius não presenciou a conclusão de sua obra que fora
sintetizada em 40 volumes, contendo mais de 22.000 espécies de plantas. Após
sua morte, cientistas de outras nacionalidades ajudaram a concluir a obra que
foi finalizada em 66 anos.
Lundu instrumental recolhido por Von Martius em sua viagem ao
Brasil entre 1817 e 1820, publicado como anexo do livro "Viagem pelo
Brasil", de Spix e Martius. É o registro musical mais antigo que se
conhece do lundu. .
Suas observações não se restringiram à botânica, suas obras
contêm diversas pesquisas sobre etnografia, folclore brasileiro e estudos das
línguas indígenas.
A obra Viagem pelo Brasil descreve detalhadamente os costumes
e características de diferentes tribos brasileiras, também descrevendo as
línguas usadas por cada tribo. Martius faz uma tentativa de classificar as
diferentes tribos, demonstrando sua visão etnocentrista, colocando os indios em
uma posição inferior ao homem europeu.
As opiniões de Von Martius e os preconceitos nelas encontrados
são fruto do século XIX, uma época na qual idéias de eugenia predominavam no
mundo civilizado. Desde o período colonial, é possível encontrar escritos que
foram chamados de ´histórias do Brasil´, tais como relatos de administradores,
missionários e viajantes que registraram os fatos ocorridos e observações sobre
a vida e os costumes dos habitantes do Brasil entre os séculos XVI ao XVIII.
Todavia, a preocupação com uma história que tomasse a ideia de um passado
nacional é engendrada de maneira pontual com o surgimento político do Brasil
independente. A partir da criação do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (1838), cerca de sete anos antes da data da monografia, é que se
percebe mais claramente a preocupação por parte da elite letrada e política com
o projeto de formular uma história do Brasil. Mas é somente na década seguinte
é que se acentuam as questões referentes à formulação de uma história pátria.
Em um momento que a elite dirigente buscava consolidar o Estado imperial, todas
as questões relativas à história do Brasil seriam cruciais para traçar a forma
de se contá-la e a forma como os brasileiros se veriam a si próprios.
Para buscar as respostas a essas inúmeras questões, o
secretário do referido Instituto, Januário da Cunha Barbosa, propôs uma
premiação para quem respondesse sobre qual o melhor sistema para escrever a
História do Brasil. O ganhador do concurso foi von Martius, em contato com a
voga da disciplina histórica na Europa, particularmente na Alemanha e propôs
uma história do Brasil que fosse ao mesmo tempo "filosófica" e
"pragmática", tendo como eixo a formação de seu povo, incluindo nesta
formação a "mescla das raças".
A monografia de von Martius "Como se deve escrever a
história do Brasil" aparece inserida numa preocupação com uma história que
tomasse a ideia de um passado nacional, comum a todos os
"brasileiros", que teve início com o surgimento político do Brasil
independente. Sua contribuição foi tão importante para o conhecimento da flora
brasileira, que von Martius foi homenageado como um nome de rua, no bairro do
Jardim Botânico, na cidade do Rio de Janeiro.
Com sua pesquisa, Von Martius inaugura uma linha de
pensamento que descreve a formação da identidade nacional brasileira, a partir
da junção das três diferentes “raças” e os fatores naturais. Essa linha de
pensamento influenciou muitos historiadores do século XIX e também a produção
literária da época que se voltava aos cenários descritos pela viagem de Martius
e Spix em romances e poesias.
Ainda não há muito tempo era opinião geralmente adotada que
os indígenas da América foram homens diretamente emanados da mão do Criador.
(…) Enfeitado com as cores de uma filantropia e filosofia enganadora,
consideravam este estado como primitivo do homem: procuravam explicá-lo, e dele
derivavam os mais singulares princípios para o Direito Público, a Religião e a
História. Investigações mais aprofundadas, porém, provaram ao homem
desprevenido que aqui não se trata do estado primitivo do homem, e que pelo
contrário o triste e penível (sic) quadro que nos oferece o atual indígena
brasileiro, não é senão o residuum de uma muito antiga, posto que perdida história.
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