Hugo Navarro Silva |
Suposto, na linguagem comum, sempre foi o que não é real,
mas fingido, hipotético, falso e enganoso embora se apresente como verossímil
ou admissível. Particípio passado do verbo supor, significa o que é apresentado
falsamente no lugar do legítimo ou verdadeiro. O Pe. Vieira usou a palavra neste
sentido: “Quantas vezes, com nomes supostos, se roubam os prêmios ao
benemérito?” Suposto tem um sinônimo
esquecido e desprezado, supositício, que ainda figura nos dicionários, aplicável ao
que é falsamente posto no lugar do que é autêntico.
O mundo é testemunha
de indivíduos que têm aparecido fazendo-se passar por personagens famosas,
vivas ou mortas. Alguns alcançaram êxito, embora passageiro, e granjearam sucesso
entre as massas. Afirma a História que falso Nero teve que ser derrotado pelo
imperador Othon, na Ásia, onde teria reunido exército e seguidores anos depois
da morte do verdadeiro imperador romano. Outro falso Nero teria surgido na
Grécia dando trabalho aos romanos. Suposto Alexandre, o Grande, teria causado
intranquilidade e desordens, em Roma, onde reuniu considerável número de seguidores.
Foi preso e condenado às galés. Já houve
um falso Agrippa, referido por Tácito, e pelo menos um também falso D.
Sebastião, de Portugal, o monarca que herdou o trono ainda na barriga materna,
foi rei com três anos de idade, começou como o “desejado” e terminou como o “encoberto”
depois que desapareceu sem deixar rastros na batalha de Alcácer-Quibir, em
1578, quando liderava exército de cristãos contra árabes. Mereceu referências na obra de
Camões e ganhou fama de “adormecido”, que voltaria a Portugal em dia de
nevoeiro para livrar o país de tribulações e do domínio estrangeiro. Tamanha
força ganhou a esperança da volta de D. Sebastião para resolver dificuldades,
que nos sertões bahianos, durante a Guerra de Canudos, Euclides da Cunha
recolheu, entre os matutos, versos que se referiam à esperada volta do
malogrado monarca: “Lá vem D. Sebastião/ comandando regimento/ acabando com o
civil/ e fazendo casamento”. No começo da República, quando se separou aIgreja
do Estado, o recém estatuído casamento civil encontrou forte resistência no seio do povo acostumado a viver sob a teocracia do Império.
A Constituição de 88
aceitou o que já existia em várias constituições sul-americanas: o princípio da
não culpabilidade da pessoa indiciada em inquérito policial ou acusada em
processo criminal antes de sentença definitiva e condenatória. O princípio teria
se originado da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, embora haja notícias de sua aplicação na antiga Roma.
Adotada constitucionalmentea presunção de inocência,os
responsáveis pelos noticiários, os jornalistas em geral, para evitar processos,
aborrecimentos e prejuízos passaram a usar a palavra “suposto” com intensidade
e abrangência, banalizando-a de tal forma que o termo vai
assumindo a conotação de “sem culpa”, com o que se livra de qualquer suspeita toda sorte de criminosos, principalmente pela dificuldades de se
encontrar sentenças definitivas em todo o vasto território
nacional. O uso desordenado da palavra “suposto”
ameaça se estender à política partidária, às campanhas eleitorais, onde tudo
passa a ser realmente falso, suposto, e às badaladas obras públicas de vésperas
de eleição, prometidas ou realizadas em parte, o que coloca grave dilema na
vida do povo feirense: O recentemente reinaugurado e chamado aeroporto de Jaíba
é suposto aeroporto ou aeroporto suposto?
Hugo Navarro da
Silva - Santanopolitano, foi aluno e professor do Colégio Santanópolis.
Advogado, jornalista escreve para o "Jornal Folha do Norte".
Gentilmente, a nosso pedido, envia semanalmente a matéria produzida
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